Uma linda historia escoteira

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Era uma vez...

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Chefe Paulo R.R. Costa. O fantasma do Cemitério Negro.



Crônicas Escoteiras
Chefe Paulo R.R. Costa.
O fantasma do Cemitério Negro.

                 Em 1974, eu era monitor da Patrulha Sênior Duque de Caxias do extinto GE Dom Diogo de Souza em Bagé-RS. Apesar da idade, minha memória ainda se encontra em condições razoáveis e por isso lembro-me de muitos detalhes, a começar pelos integrantes da patrulha, Sub-monitor Vinícius, patrulheiros Gerson Maidana, Álvaro (Alvinho), José Luis (conhecido como “primeira voz” por ser muito desafinado para cantar, ou ainda por “pouca sombra” ( acho que era devido a sua pequena estatura. Marcelo e dois novatos, Anadon e Bugu. Os nomes principalmente dos últimos penso ser Paulo Roberto ou Paulo Ricardo, não lembro ao certo, mas era muito parecido com o personagem dos quadrinhos do Mauricio, daí o apelido).

               Na semana da Pátria, no dia 7 choveu e o desfile foi transferido para a sexta-feira seguinte, 13 de setembro. O chefe do Grupo Escoteiro era o Reinaldo Quintana, auxiliado pelos chefes João Manoel e Wagner. O dia era marcante para a patrulha sênior. Recém-formada, a chefia autorizou um acampamento da patrulha sem o acompanhamento de nenhum chefe. Tudo pronto, mochilas na sede, prontinhas para sairmos logo após o desfile cívico que ocorreu a tarde. O local do acampamento distava uns 5 km da cidade, na propriedade de um tio do Vinícius, os veteranos sabem que na época acampava-se em qualquer lugar, pois não existiam as estruturas de campings que hoje existem. A saída prevista para sexta à tarde após o desfile, com retorno no domingo. A chefia exigiu um croqui do local do acampamento, itinerário de deslocamento, planejamento das atividades, etc, o de praxe.

              Saímos da sede já no final da tarde e logo escureceu, sem problemas, levávamos lampiões a querosene, em fila indiana, um lampião à frente e outro na retaguarda. Chegamos à fazenda, falamos com o caseiro (que nem tinha sido avisado, mas autorizou a entrada tendo em vista se tratar do sobrinho do patrão e de seus colegas). Da casa da fazenda, seguimos pelo campo para chegar às margens de um riacho que corta a propriedade. Detalhe, nenhum de nós tinha noção da distância até o riacho, andamos um trecho e encontramos um túmulo bem antigo, no meio do campo (antigamente na zona rural era comum enterrarem-se os mortos no campo, ou muitas vezes, erigia-se um túmulo falso, somente para marcar o local onde ocorreu a morte, tendo sido o cadáver sepultado em algum cemitério próximo).

              Passamos o túmulo uns 20 ou 30 metros adiante encontramos uma clareira e pimba... Tivemos a excelente ideia, como não sabíamos quanto faltava para chegar ao riacho, estávamos cansados e famintos decidimos, pernoitamos aqui nesta clareira, e amanha, de dia, continuaríamos... Ideia aprovada por todos. Foram divididas as tarefas, fogueira acesa, cozinheiro preparando a boia, eu e o Vinícius armando um toldo para toda a patrulha dormir embaixo. Os novatos empolgadíssimos... Eis que ouve-se uma voz rouca, apavorante, vindo da direção do túmulo: “O que vocês querem aquiiiiiiii?” Ninguém correu, claro que vontade de correr não faltou, mas correr pra onde? Olhei na volta, todos me olhando e esperando alguma atitude, por ser o monitor, também o mais velho (meses) e também o mais corpulento. O meu cabelo crespo (na época eu ainda tinha cabelos) estava em pé, a boina lá nas alturas. Na hora eu estava batendo um espeque com a machadinha e o Vinícius estava colocando um bastão como esteio do toldo.

                  As minhas pernas tremiam, lá “naquele lugar” não entraria nem uma agulha mesmo que tentasse enfiar a marretadas, mas eu pensei, putz... Se eu correr vai ser um fiasco enorme, e os demais... Estão confiando em mim...  Resolvi apelar para a diplomacia e conversar com o falecido. Ensaiei uma voz bem simpática (contraindo todo o corpo para tentar disfarçar a tremedeira, diante dos meus patrulheiros) e respondi: “Boa noite, nós somos escoteiros do Grupo Escoteiro Dom Diogo de Souza, e vamos dormir aqui e amanhã cedo vamos continuar o caminho”. Não adiantou, o fantasma não se calou e respondeu... “Voces vieram profanar o meu túmulo...”, Respondi educadamente (O Escoteiro é cortês), “Não senhor, não queremos incomodar, só vamos dormir e amanhã vamos embora...” Não adiantou, o fantasma respondeu: “Fazem 30 anos que eu estou aqui e...” não teve tempo de completar a fase, a essa altura perdi a compostura e lasquei, “Olha por mim tu pode ficar mais 30 ou quanto quiser, que daqui não vamos sair” nessa hora o Vinicius, acho que tremendo mais do que eu, me olhou, pegou o bastão, eu ainda estava com a machadinha na mão, ele me disse: Vamos Romério? Não precisou falar de novo, partimos todos com o que tínhamos na mão, em direção ao túmulo, nem sei o que pensamos na hora, acho que a intenção era moer o fantasma, ou pelo menos o túmulo, de pancada.

                Eis que se acendem duas lanternas no túmulo e os berros... “Calma, calma, somos nós”... Nada mais, nada menos do que os dois chefes, João Manoel e Wagner, que ficamos então sabendo, estavam atrás de nós todo o tempo desde a saída da sede, observando nosso comportamento, por ser o primeiro acampamento sem a presença de adultos. Sinceramente, a sorte foi que estávamos todos com muita fome, então não tinha nada sobrando no intestino, porque se tivéssemos “bosta” pronta, com certeza teríamos adubado o solo... Passado o susto, patrulha em forma, apresentação, etc.

              Vieram os elogios pela excelente conduta durante o deslocamento, mesmo não sabendo que estávamos sendo observados. E ai veio o melhor... Os chefes disseram: - Rapazes... Estávamos esperando uma oportunidade para aprontar uma com vocês, e este túmulo veio a calhar, sinceramente pensamos que voces sairiam correndo e abandonariam o material, mas a reação nos surpreendeu de forma muito positiva. Voces não sentiram medo? Ai veio à resposta: Medo? Capaz, acha que acreditamos em fantasma, tínhamos certeza de que era algum engraçadinho querendo apanhar - Vocês escaparam por pouco, mas não façam isso outra vez, pois podem se dar mal. Já viram com quem estão lidando. Não somos mais “escoteirinhos”. Somos seniores!”“.

               Infelizmente perdi o contato com todos esses colegas, o único com quem consegui falar por telefone foi o Álvaro, há uns sete anos falei com ele por telefone, estávamos morando em Brasília, mas não chegamos a nos encontra pessoalmente. Gostaria muito de manter contato com algum antigo integrante dos extintos Grupo Escoteiro Dom Diogo de Souza, Sepé Tiaraju e Dom Atalício Pitã, todos da cidade de Bagé-RS, da década de 1970.

As pessoas estão tão acostumadas a ouvir mentiras, que sinceridade demais choca e faz com que você pareça arrogante. (Jô Soares)

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