Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

sábado, 13 de outubro de 2012

A Faca do Escoteiro.



Crônicas de um Chefe Escoteiro.
A Faca do Escoteiro.

                 Quase não vejo em fotos. Se tiver alguns escoteiros e ou escoteiras que portam suas facas do lado direito preso ao cinto não sei. Mas olhe, quem já usou sabe do orgulho em estar com uma e muitos jovens olhando com admiração. Claro aprendíamos que elas só podiam ser usadas para atividades mateiras, cortes simples de cordas, quem sabe descascar uma laranja, mas neste caso melhor o canivete Escoteiro. Não aquele de mil e uma utilidades. Sempre gostei dos mais simples. Nosso Chefe e eu também quando fui Chefe de Tropa e Sênior era exigente quanto a isso. Mas se o jovem tem condições e se esforçou para ter este direito porque não usar? Existe por parte de muitos a ilusão de que é uma arma. Pode influenciar no futuro. O público não vê com bons olhos. Será? Durante anos e anos eu usei, autorizei jovens a usarem e nos acampamentos, ah! Nos acampamentos. Eles andavam aqui e ali soberbos com suas facas mateiras. E olhem, nunca vi nenhum deles até hoje, já homens feitos com esta ilusão de andar armado. E o público? Muitos deste “público” me perguntam onde andam os escoteiros e sua faquinha?

                É gostoso no campo portar uma faca. Dá-nos uma sensação de segurança. Eu tinha uma mundial simples. Já vi relatos de cada uma de tirar o sono. Dizem que são lindas. Nunca vi principalmente as importadas, mas quem era eu para ter uma delas? A minha eu tratava-a com carinho. A capa de couro, ou melhor, a bainha sempre engraxada, por dentro talco de bebê para proteger a lamina e não deixar enferrujar. Usou? Primeiro limpar antes de colocar na capa. Sabíamos que faca não é para cortar madeira quiçá poderiam servir para cortar uns gravetos para o fogo. Saber carregar assim como o machado simples ou do lenhador, ou mesmo o facão mateiro era uma arte. E cerimonia de entregar a ferramenta a outro Escoteiro? Um espetáculo a parte para ser visto. Saber afiar era outra. Quando jovem tivemos um campeonato de lançamento de facas. Tínhamos facas especiais para isto. As nossas não. Não foram feitas para impacto.

              Disseram-me que o processo de fabricação de uma boa faca consiste em modelar a lâmina, através do processo de forja ou de desbaste, aplicar um tratamento químico conhecido como têmpera que confere a dureza ao fio da lâmina. Costumava proteger o cabo com um protetor plástico que esticava quando colocado e depois se firmava. Lembro-me do meu Chefe e eu mesmo dizendo aos escoteiros e seniores sobre a faca. Explicava sobre a lâmina, sobre o cabo ou empunhadura, a ponta ou ponteira, o fio ou gume, o desbaste, onde era o dorso, o ricasso, a guarda, o pomo e o cordão. Para ser sincero eu mesmo não dava muita importância às estas nomenclaturas. Para mim o mais importante sempre foi o saber conservar, limpar, usar e manusear. Feito isto que os escoteiros usassem suas facas. Acho e poderia dizer com certeza que sempre foi e pode ser uma forma de motivar os jovens na senda Escoteira. E tenho certeza. Eles até hoje sonham com isto.

                  Não vejo o porquê não deixá-lo usar nas reuniões de sede, nas atividades ao ar livre e principalmente nos acampamentos. Se ele está bem preparado, se é um bom Escoteiro, se foi adestrado suficientemente tenho certeza que ele sentirá orgulho no uso da faca. Irá olhar para os outros e dizer – Façam como eu. E um dia também usarão a sua. Mas olhe, respeito os chefes que são contra. Não vou dizer a eles que nunca usaram e, portanto não sabem a importância de uma faca presa no cinto do lado direito de um Escoteiro ou Escoteira, bem uniformizado (a). Ou mesmo junto ao pequeno cabo de cinco a dez metros que não pode faltar no uniforme. Bem enrolado a moda Escoteira. O que? Isto é passado? Amado passado! Porque não voltas novamente? – Ainda lembro na sede ou no campo das inspeções rotineiras – Escoteiro? Sim Chefe! – Me mostre sua faca! – Eu a pegava pelo cabo, deixava o Chefe ver o talco protetor, pegava com carinho no dorso e dava para ele o cabo. Ensinou-me assim. Segurança! E ali ficava a sorrir de orgulho!

                  Minha faca Escoteira. Guardada até hoje. Não a uso mais a não ser se for a um acampamento ou uma excursão. Acampamento eu? Claro meu amigo, em sonhos! Mas gostaria de ver os escoteiros e as escoteiras como outrora. Respeitosos! Disciplinados! Vigilantes! Sempre Alertas! Boas ações feitas! Sorriso no rosto! Uniforme impecável! Treinados e prontos a demonstrarem suas aptidões e suas faquinhas do lado. Sei que existem muitos por aí neste mundo de Deus que ainda usam. Mas as facas, humm! As facas estão sumindo. E atrás delas muitos jovens cujos sonhos se perderam na modernidade. Minha faca Escoteira. Hoje um acessório proibido. Ontem liberado. Hoje? Nem pensar. Precaução? Bem cada um sabe onde o calo aperta, mas se pudesse ser um Chefe Escoteiro elas voltariam. Sem sombra de dúvida! Meus amigos e amigas, que saudade da faca Escoteira!

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Lendas Escoteiras. Martinha escoteira e o Rei da cidade de Galiza.



Lendas Escoteiras.
 Martinha escoteira e o Rei da cidade de Galiza.

               - Porque não posso passar? Perguntou Martinha. – Porque não. Ordens do Rei da Galiza. – Não conheço e nunca ouvi falar – Não importa aqui vocês não passam. Martinha olhou de soslaio aquele enorme homem vestido com uma túnica vermelha, um capacete azul e uma grande espada na cintura. Martinha era Submonitora da Patrulha Touro. Estavam acampados próximo ao arraial do Martelo que pertencia à cidade de Taumi. Ela e Laurinha estavam à cata de lenha para o jantar e um fogo noturno onde uma gostosa Conversa ao Pé do Fogo sempre acontecia à noite antes de dormir.

               Não estavam longe do campo de patrulha. Avistaram um descampado e foram surpreendidas por este homem vestindo a moda romana. Seria alguma prova da Chefe Marta? Mas qual o objetivo? - Mas moço, insistiu Martinha ali do outro lado tem muita lenha e precisamos. Ainda não terminamos o jantar e a noite tem conversa ao pé do fogo. O que direi a monitora? – O homem da túnica vermelha pensou e pensou. – Será que poderia deixar? E o Rei da Galiza o que diria depois? – Vá, mas só até aquela árvore. Se passar eu terei que levar você na presença do Rei. Martinha pensou e Laurinha riu. – Acha que este homem é real? – Não sei falou Martinha. Mas sabe, gostaria de conhecer este Rei da Galiza. – Você vai comigo? – E agora pensou Laurinha. Não estavam obedecendo às ordens do Chefe e da Monitora. Mas conhecer um Rei? – Vamos, seja o que Deus quiser. E atravessaram a cerca e passaram dos limites permitidos.

              O homem da túnica vermelha não titubeou. Pegou as duas pelo braço, soprou no horizonte e uma ponte com um lindo arco íris apareceu. Elas atravessaram a ponte com ele no meio das nuvens brancas e avistaram o Castelo do Rei da Galiza. Passaram pelo portão e quando entraram no castelo viram um magnífico salão de refeições, as mesas faiscando de ouro e prata, carregadas de finos manjares, as vestes suntuosas que envergavam o Rei e seus cortezões e os nobres e veneráveis semblantes de todos os presentes, ficaram cheias de espanto e admiração pelo esplendor da corte do Rei da Galiza. Nunca poderiam imaginar nem em sonhos mais arrojados que conheceriam a metade do esplendor e da sabedoria que estavam conhecendo.

          O Rei mandou que se aproximassem. Mandou-as sentar ao seu lado e servirem a elas todos os manjares – Quem são vocês? Perguntou. Senhor Rei da Galiza, somos escoteiras da Patrulha Touro. Do Grupo Escoteiro Lua Azul. – O rei olhou para todos e espantado perguntou: Escoteiras? E que fazem? – Nós Senhor Rei, gostamos de acampar, excursionar, viver a natureza, amar a Deus sobre todas as coisas,  fazemos boas ações, somos alegres, respeitamos os direitos dos outros, temos palavra, somos leais, somos amigos de todos e até dos animais. E também Senhor Rei da Galiza, temos por obrigação ser pura em nossos pensamentos, nossas palavras e nossas ações!

          O Rei da Galiza ficou estupefato. Chamou o Grão Vizir e disse a ele para anotar tudo. A partir daquele dia, todo seu reino seria como as escoteiras. Que suas palavras fossem levadas nas escolas, nas ruas, nos campos de trigo, nas casas e em todos habitantes do castelo. Levantou e abraçou as escoteiras com carinho. Depois do jantar mandou o Homem da Túnica vermelha as levarem até onde estavam acampadas. Já estava escurecendo. Atravessaram o Arco Iris cheio de luzes e o homem desapareceu. Martinha e Laurinha pensaram muito se contariam a Patrulha. Acharam melhor contar em forma de esquete a noite no fogo de conselho. Assim foi feito. As escoteiras riram muito. – De onde tiraram a ideia do Rei da Galiza? Perguntou a monitora. Martinha olhou para Laurinha e deram muitas risadas. Mas estavam alegres, pois agora o reino iria aprender muito da Lei das Escoteiras. Estavam orgulhosas por ajudarem.

         E sempre, por anos a fio, quando Martinha e Laurinha acampavam ali, encontravam o homem da Túnica Vermelha e iam visitar o Rei da Galiza. Ficaram amigos para sempre. Guardaram o segredo, pois o Rei assim o quis. E até hoje, ambas nunca deixaram de fazer uma visita naquele reino onde à palavra à ética e a honra se tornaram um modo de vida de seus habitantes!           

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Laninho escoteiro e a Festa no Céu.



Lendas Escoteiras
Laninho escoteiro e a Festa no Céu.

                Nada como ser um Escoteiro sonhador. Deixar a mente voar e ser levada ao sabor dos ventos, sentir a brisa da manhã no rosto e sorrir existe coisa melhor? Participar de lindas histórias onde pode ser herói, onde pode voar conversar com os bichos as aves os peixes e sentir seu coração bater de alegria em todos os momentos? Pois assim era Laninho. Puro nos seus pensamentos nas suas palavras e nas suas ações. Na Patrulha o chamavam de “Voador”, estava sempre sorrindo e olhando o céu, os pássaros que voavam perto, os insetos e jurou que um dia fez amizade com um Quati cinzento. Quem duvidaria?

                 A tropa estava acampada no Sitio do Beija Flor. Um lindo local, uma cascata gostosa, muitas arvores frondosas, e bambus. Como tinha bambu. As Patrulhas adoravam. Laninho era dos Tigres Brancos. Um ano lá com eles. Promessado e tinha a simpatia de todo mundo. Ao seu modo colaborava com a Patrulha, mas era franzino e todos achavam que ele só vivia “Voando” e não contavam muito com ele. Naquela tarde após o banho todos foram ajudar o cozinheiro com a sopa do jantar. Laninho como sempre sentou embaixo de uma aroeira frondosa e olhava em seus galhos se tinha algum pássaro para conversar. Percebeu ao seu lado um Sapo Amarelo. Não o conhecia. O Sapo Amarelo o olhou e disse – Você pode me ajudar? – Ajudar como disse Laninho – simples, vai ter uma festa no céu. Convidaram todas as aves e eu não posso ir. Só quem pode voar. Como me disseram que você é um Escoteiro Voador, quem sabe me leva lá?

                  Laninho sorriu. Tinha lido um conto da Festa no Céu. Nele foi um urubu quem levou o sapo uma tartaruga e um esquilo que se esconderam em sua viola, pois o Urubu era um violeiro. Depois no céu ele os descobriu lá escondido em sua viola e jogou a todos nuvem abaixo. Quem levou a pior foi à tartaruga. Espatifou-se no chão. Mas Laninho ficou pensando se não podia levar o Sapo. Afinal ele sempre sonhou com uma festa no céu. Porque não ir? – Feche os olhos Senhor Sapo. Vamos para a festa você e eu! Só abra quando eu mandar. Mas o sapo não obedeceu. Abriu os olhos quando estavam sobre uma nuvem e ambos despencaram no espaço. Tiveram sorte. Caíram em um riacho de aguas límpidas. O sapo mergulhou e voltou à tona xingando Laninho. – Mas eu tentei te ajudar – falou. Nada disto. Você me soltou no espaço. Laninho chorou muito e o sapo ficou triste também. Nesta hora o Urubu Rei viu aquela choradeira e ficou com dó do sapo. – Deixa que eu levo você em minha viola.

                  Bem como o sapo foi não preciso contar. Todos conhecem a história da Festa no Céu. Laninho despencou de um galho e caiu com tudo no chão. Não machucou, mas quando abriu os olhos viu toda sua Patrulha rindo. – Ele também riu. Contou para eles que estava chegando ao céu e o sapo o jogou no espaço. Eles iam a uma festa no céu. – Todos riram a valer. - Esse Laninho, falou o Monitor. O Sub Monitor rindo falou – Mas Laninho, só você e o sapo? E a tartaruga? E o Esquilo? Eles não foram também? – Laninho riu e disse – Melhor perguntar a eles, estão atrás de vocês! – A Patrulha olhou espantada e viu um Esquilo e uma Tartaruga rolando pelo chão e dando enormes gargalhadas!

                 Se Laninho e os bichos foram com ele a festa no céu eu não sei, mas que até hoje ele conta como o Urubu tocava sua viola e crocitava, fazendo coro com a Araponga e o Papagaio. Não faltando a Gralha o Cisne, a Pomba e o sabiá que gorjeava como nunca. E assim nunca mais a Patrulha de Laninho duvidou de suas histórias e todos os fogos de Conselho deixavam-no falar, cantar e contar seus contos fantásticos. E como digo sempre, toda a história tem um fundo de verdade, mas histórias são histórias. Quem quiser mudar que conte outra. Que Laninho viveu feliz para sempre eu sabia, pois o Escoteiro é Alegre e sempre sorri nas dificuldades!      

Falando de Escotismo. Toninho de Lorena.



Falando de Escotismo.
Toninho de Lorena.

              Não sou muito de falar de pessoas nominalmente. Chefe, escotistas, dirigente seja lá o que for. Como floreio muitos meus escritos pode ser que venha a destoar do contexto e alguém não gostar. Toninho de Lorena é diferente. Para mim é especial. Assim como eu e acredito que muitos outros que conviveram ou convivem com ele dizem o mesmo. Quem o conhece pessoalmente sabe que além de ser um excelente Escoteiro é um excelente adestrador. Resolvi escrever sobre ele porque ele me manda sempre seu jornalzinho o Cuco do Vale. Escrito a mão. Em letra de forma. Xerocado. Disseram-me que ele não gosta da modernidade e nem olha para ao computador. Queria conversar com ele aqui, mas ele nem dá as caras. Outro dia vi uma foto sua e está tão "Velho" como eu. Mas na minha mente ainda guardo na memoria sua face nem tão novo nem tão "Velho". Um companheirão. Porque digo isto?

             Sem entrar em polemica, cheguei a São Paulo em 1977.  Um mês depois fui à região e deixei lá meu curriculum Escoteiro e me colocando a disposição. Afinal em Minas fui regional e dirigi centenas de cursos. Enquanto aguardava contato da região entrei em um Grupo Escoteiro para ajudar. Não podia ficar parado. Nunca a região me chamou. Sabia que tinha estados que os membros da equipe não aceitavam intrusos. Acho que já tinham suas equipes formadas e eu era carta fora do baralho. Durantes oito meses esperei. Depois resolvi fazer meus cursos por conta própria em dois distritos, mas devidamente legais com autorização da Equipe Nacional de Adestramento. Sabia como fazer.

             A dificuldade começou quando precisava contar com colaboradores ou assistentes. Conhecia pouca gente. Fui mais por informação. Consegui fazer amizade com dois Insígnia e uns três DCB. Um deles me falou do Toninho de Lorena. Convite feito convite aceito. Começou uma ótima amizade entre nós e um respeito mútuo. Conheci outro grande amigo O Professor José Renato dos Santos. Tinha assumido como regional (grande Escoteiro, lutamos juntos por anos a fio para modificar as coisas, mas não deu). Convidou-me para ser o Diretor de Adestramento Regional (todas as nomenclaturas agora foram alteradas). Convite feito convite aceito. Enviei correspondência para todos os adestradores, DCBs e DCIMs para uma reunião. Poucos compareceram. Dos antigos lá estava o meu hoje muito querido Chefe Elmer, o prestativo Walter Dohme (grande adestrador) e mais uns três que não conhecia. Os demais não apareceram.

             O Toninho era uma figura. Um dos melhores técnicos em arte mateira que conheci e conhecedor emérito de escotismo. Ficamos amigos. Fui a Lorena diversas vezes. Acampei com o grupo que colaborava em Piquete próximo ao Pico dos Marins. Conhecido no Brasil inteiro. Ele deu um apoio que nunca esqueci. Quantas e quantas noites após os alunos irem dormir, ficamos no Campo Escola do Jaraguá jogando conversa fora. Várias vezes formávamos uma rodinha onde poderiam estar presente o Pedestre, o Walter, o Jair Mantenauer lá de São Vicente e alguns outros que não lembro os nomes agora. (eles, por favor, me desculpem). O Toninho ficava horas e horas contando “causos” falando de técnicas escoteiras e muito mais. Nunca em tempo algum ele disse não aos meus convites. Nunca me disse para a região pagar suas despesa de viagem de Lorena a São Paulo. Acho que os mais de oitenta cursos que dirigi na capital e interior pelo menos quarenta ele estava ombro a ombro comigo.

              Depois tivemos muitos outros adestradores DCBs e DCIMs participantes. DCIM só o Elmer. Ficamos amigos. Foi para mim uma época de ouro.  Mais de 1.500 alunos tive a honra de conhecer no Estado de São Paulo. Acho que se não fosse o Toninho de Lorena, ou melhor, o hoje DCIM Antônio Rodrigues (na época só IM) não teria conseguido o que consegui fazer durante aqueles belos anos de 1978 a 1985. Os tempos correram céleres. Outro Regional. Bay Bay Osvaldo. Os convites para cursos rarearam.

              Gostaria que alguém lá da sua área que estivesse lendo este comentário se possível tirasse uma cópia e enviasse ao Toninho. Gostaria que ele soubesse que me orgulho em ter sido seu amigo. Para mim uma honra. Ainda tenho vontade de ir a Lorena levar a ele meu abraço. Para mim hoje é impossível. Todos me obedecem menos minhas pernas e meu pulmão. Um dia ainda dou um jeito neles (risos). Quando leio o Cuco do Vale e Leio tudo é como se o Toninho estivesse pessoalmente comentando. A confecção do jornalzinho é sagrado para ele. Ali ficamos sabendo de tantas coisas mesmo não estando presente junto a ele. Toninho, meu abraço. Que seja muito feliz, pois nós os adestradores de outrora (eu, pois sei que ele ainda continua na lida) temos orgulho do que fizemos principalmente em sua companhia. Certo ou não todos nós vivemos felizes em uma época de ouro.

Sempre Alerta Toninho de Lorena!                      

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

“happy ending” Um final feliz!



Crônicas de um Chefe Escoteiro.
“happy ending” Um final feliz!

                  Como está lindo o sol. Não sei por que nunca soube que ele seria tão importante em minha vida. Nunca fui tão feliz como agora. Sentia-me bem ali, melhor do que antes junto a amigos do bairro, soltando pipas, jogando bola, ou contando “causos”. Tentei convencê-los a ir comigo, mas riram dizendo que ser Escoteiro é para trouxa. Eles coitados não tinham a menor ideia do que eu estava fazendo, mas eu sabia o que eles estavam fazendo. Eles não estavam fazendo nada. Nesta hora tenho certeza que alguns dormindo, outros na porta olhando a rua vazia e pensando no que iam fazer. Quanta diferença! Meu dia, cada dia era melhor que o outro. Para dizer a verdade até minha mãe duvidou que pudesse gostar tanto como gosto de ser Escoteiro.

                 Meu nome é Marcus.  Nunca pensei em ser escoteiro. Tinha visto eles algumas vezes no parque, no shopping, e em bandos cantando e rindo pelas ruas do bairro. Bando de loucos pensava! E eis que um dia passei próxima a sede deles. Uma turma correndo, outra jogando, lobinhos de azuis procurando um tal de Mowgly, os grandões em cima de uma árvore dizendo que era um Ninho de Águia. Pode? E fiquei ali parado olhando embasbacado e pensando comigo mesmo – Que diabos era tudo isto? Risos. Desculpem os diabos. Maneira de dizer. Sem perceber me aproximei mais. Um Chefe sorridente me olhou e abanou o chapéu dizendo – Olá! Já conhecia os escoteiros? – Não Senhor! – Então se aproxime. Se quiser você brinca um pouco em uma patrulha e alguém de lá vai dizer a você quem somos nós!

                 Foi o meu começo. Nunca na vida tinha sentido algum igual. Uma turma que chamavam de Patrulha que pareciam irmãos. Bem mais que irmãos. Cada um sabia o que fazer. Sempre ajudando um ao outro. Em um jogo de quebra canela com um cobertor nenhuma canela foi quebrada, mas quantos tombos! – Me contaram sobre como surgiu o escotismo. Do general Inglês que foi seu fundador. Ensinaram-me nós, alguns sinais de pista, me mostraram o céu e disseram que ele era tudo para os escoteiros, muitas vezes a barraca para dormir. Falaram no sol, que sempre caminha para o oeste, falaram do vento, das chuvas gostosas do verão, das noites de lua cheia, nas estrelas, das brisas frescas da manhã de primavera, de um fogo que chamavam de Fogo do Conselho onde cantavam, brincavam e representavam. Meu Deus! Fiquei abismado. Voltei para casa correndo. Mamãe, Mamãe, você precisa me matricular nos escoteiros!

               Olhem, acho que valeu. Foi à decisão mais importante em minha vida. Meu Chefe que “cara” bacana. Alegre, jovial, espirito leve e solto a nos ouvir, compreender, aconselhar. Entrei na patrulha do Condor, me receberam com um grito de guerra. Aprendi logo. Gritava como nunca em minha casa. Minha família ria. Fiz minha promessa. Dia de festa, de fotos, de abraços dia que marcou para sempre meu coração Escoteiro. Todo mês saiamos da sede. Sempre para um lugar com cheiro da terra, onde poderia ter um riacho para brincar, para molhar os pés, para pescar! Em cada três meses um acampamento. Estes então! Incríveis. Cheios de aventuras. Uma vez seguimos os passos de um boi que havia entrado na mata. Fomos pé ante pé e o descobrimos comendo capim colonião como se nada acontecesse em sua volta.

              Fazíamos coisas do arco da velha. Subíamos em cordas em árvores frondosas, um dia inteiro preparando uma catapulta para ver que mandava mais longe uma bexiga cheia d’água! Quantas risadas! Uma ponte três pontas. Fácil de fazer para atravessar uma vala ou um riacho. Uma noite um jogo que nunca esqueci. Minha Patrulha foi sorteada para passar em um trecho do bosque pelas outras três e foi o máximo. Pintamos todo o corpo de preto. Aprendi a rastejar como exploradores noturnos e não consegui passar, mas dois da Patrulha conseguiram. E no último dia foi o dia que chorei. E como chorei. Foi lindo. Acenderam o fogo com um palito de fósforos. Uma festa, o Escoteiro que acendeu recebeu seu batismo de guerra. Pulou três vezes sobre o fogo e passou-se a chamar Nambiquara, aquele que é inteligente, muito esperto. Que lindo foi! Breve eu também terei meu nome de guerra. Estou escolhendo.

            E a noite foi encerrada cantando. Cantamos a Canção da Promessa e aquela que sempre marca “A Canção da Despedida”, como emociona! Como a gente nunca mais esquece! Parece que a união ali com as mãos entrelaçadas é como uma promessa de amor ao escotismo para sempre! Foi bom. Muito bom mesmo. O Escotismo mudou minha vida. Meu grupo escoteiro agora é minha segunda família. Lá tenho tudo que desejei. Adultos que parecem mais irmãos, escoteiros e escoteiras que se respeitam. Dizem que lá aprendemos não só a ser herói, mas também a ter palavra, honra e saber que a ética faz parte do nosso crescimento. Gente! Como sou feliz! Amo de montão o escotismo! Nunca mais irei esquecer as horas mais felizes de minha vida que ele me deu vai dar-me por toda a vida!

E quantos Marcus nós temos por aí?        

terça-feira, 9 de outubro de 2012

O Selvagem das Terras Altas.



Evitar o perigo não é, a longo prazo, tão seguro quanto expor-se ao perigo. A vida é uma aventura ousada ou, então, não é nada.

O Selvagem das Terras Altas.
A história do Cacique Capotira. O Selvagem da Cabeça Branca.

                Se havia algum que me deixava deprimido era não poder fazer alguma atividade que por um motivo ou outro pensei em fazer. Nunca em minha vida tive medo de enfrentar a estrada, as matas, campinas, os rios estreitos e largos, as cachoeiras, as corredeiras infernais e até as mais altas montanhas. Deliciava-me quando conseguia conquistar cumes imensos, atravessar rios caudalosos seja de que maneira for descendo corredeiras ou mesmo encontrar com o imponderável pela frente era motivo de orgulho. Não sei quantas vezes passei por isto. Medo? Um pouco. Muitas vezes “molhei as calças” e não me envergonho de dizer. O que me deixava agora chateado era não encontrar alguém da Patrulha para ir comigo. Estava enfezado. Israel disse que não podia – Bitelô, como vou ficar vinte dias fora? – Tãozinho então – Nem posso pensar nisto Bitelô, meu pai não vai deixar nunca. E assim um por um não encontrei ninguém que topasse enfrentar um desafio novo.

               Tudo começou quando fui cortar o cabelo na Barbearia do seu Praxedes. Era o barbeiro do meu pai há muitos anos. Eu cortava cabelo com ele desde os cinco. Ele sempre soube o que fazer e como era o corte. Estava lá entretido quando entrou um sujeito com um bigode que nunca tinha visto um igual. Enorme. Diria que os lados quase alcançavam ao queixo. Passou um tempo e ele começou a conversar com o seu Praxedes e conversa vai conversa vem disse que morava na Morada do Morto Vivo. Nunca ouvi falar. Seu Praxedes balançou a cabeça. Contou então a história mais incrível que tinha ouvido. Disse que bem longe de sua casa, bem ao norte subindo o Rio Turvo, quem sabe duas semanas a pé, existia uma serra alta, toda tomada por uma imensa floresta. Ninguém ainda tinha entrado nela. Era completamente desconhecida. Um dia um homem todo marcado e sangrando como se tivesse sido esfolado vivo chegou a sua porta pedindo ajuda e socorro. Trataram dele dentro do que conheciam e no quinto dia ele partiu. Quando ia virando a curva da Trilha da Goiabeira gritou – Nunca tentei entrar na Floresta do Diabo! Lá ainda mora o Selvagem da Cabeça Branca. Ele não conversa com ninguém. Ele esfola e mata. E sumiu junto as plantação de figo que tínhamos acabado de plantar.

              Depois não falou mais. Cortou o cabelo aparou o bigode e quando ia saindo o segurei pelo braço. Ele me olhou e vi nos seus olhos faiscarem. Conhecia este tipo de valentia de outras eras quando das minhas brigas eternas e quase desisti de perguntar. – Moço, como faço para chegar na Floresta do Diabo? Ele riu. Pegue o trem. Desça em Baixo Guandu. Suba o Rio Turvo por oitenta quilômetros. Quando avistar uma garganta entre duas montanhas, vá por baixo mais dez quilômetros. Quando ela terminar irá ver uma imensa floresta subindo aos céus e densa por causa do nevoeiro. É lá. Mas menino, nunca vá lá. O Selvagem da Cabeça Branca dizem nunca deixou ninguém vivo e os que conseguiram fugir ficaram com sequelas no corpo morrendo em poucos meses. Virou-me as costas e sumiu na Rua do Sumidouro e nunca mais o vi. À noite minha patrulha tinha marcado uma reunião na sede. Pretendíamos acampar nas férias de julho e poderíamos escolher um bom local e quem sabe fazer as grandes pioneirias que sempre planejamos e não fizemos. Poderíamos ficar oito dias acampados.
  
               Enquanto todos discutiam lembrei da conversa do Homem do Bigode Rastapé que me contou a história fantástica. Contei para a Patrulha. Riram e não deram atenção. Tentei de todo modo motivar a irmos lá. Foi Israel que colocou a questão crucial – Olhe Bitelô, Oitenta quilômetros rio acima, depois mais vinte. Você sabe. Sem trilhas, matas dos dois lados e com corredeiras tem de ser a pé. Pelos meus cálculos não conseguiremos andar mais que vinte quilômetros por dia, e olhe lá. Só aí seriam cinco dias para ir e mais cinco para voltar. Nem sabemos o que vamos encontrar. Claro que na volta uma jangada pode nos trazer mais rápido, mas e então? Subir uma montanha que ninguém nunca subiu? E se for verdade esta historia do tal Selvagem esfolador? Não somos heróis. Nem sabemos o que vamos encontrar.

               Tentei de todo modo motivar a turma. Não estava conseguindo convencer aqueles seniores destemidos. Deram todo tipo de desculpa. Parece que não era a minha Patrulha que não recusava nenhum desafio. Voltei para casa frustrado. No dia seguinte Pedrinho me procurou em casa cedo ainda – Olhe Bitelô, não dormi a noite. Só pensando nesta história do esfolador. Encontrei com o Israel e ele me disse a mesma coisa. Acho que devemos nos reunir hoje na sede e conversar de novo sobre isto. Dito e feito. A Patrulha conversou por horas. No final tudo planejado. Achávamos que quinze dias seriam suficientes. Os seis valentes seniores da patrulha Cascavel iriam entrar em ação novamente. Que nos esperasse a Floresta do Diabo. E que se danasse o Selvagem da Cabeça Branca. Ele ia conhecer uma turma da pesada! A aventura ia começar e que aventura foi meu Deus!

                Seu Josué era o Chefe da Estação da Estrada de ferro. Já nos conhecia. Aproximou-se e perguntou – Para onde vão desta vez? Até Baixo Guandu Seu Josué. E de lá? - Bem vamos tentar chegar até a Floresta do Diabo. Isto é vamos subir o Rio Turvo. – O rio eu conheço, mas esta floresta não. Cuidado com o Rio. Quando menos se espera ele sobe até dois ou três metros do seu nível.  Gente boa seu Josué. O trem parou na plataforma. Subimos na Segunda Classe e logo ele partiu. Seriam por volta de três horas de viagem. Se tudo corresse bem chegaríamos em Baixo Guandu lá pela uma da tarde. Foram preparativos imensos. Nossa ração que estávamos acostumados era de no máximo dez dias. Ração para quinze ou vinte não sei não. Mas achamos que encontraríamos pelo caminho muita verdura, peixes e quem sabe algum animal ou ave para matar a fome e economizar nosso farnel.

                   Éramos seis. Eu, Romildo, Fumanchú, Taozinho, Israel e Pedrinho. A Patrulha estava completa. Todos foram segunda e Primeira Classe quando escoteiros e agora muitos portavam a eficiência II. Não havia pata tenras. Passamos juntos por poucas e boas. Na viagem o espírito era nota dez. Cantamos, contamos “causos”, até umas piadinhas que não podiam ser contadas para os lobinhos. Meio dia e meio avistamos Baixo Guandu. Uma cidade de mais ou menos quinze mil almas naquela época. Hoje não sei. Antes de o trem entrar na estação avistamos o pontilhão do Rio Turvo. Descemos e como sempre atraiamos atenção. Não dava tempo para conversar. Partimos. Um trecho de estrada estadual e logo uma carroçável margeava o rio. Sabíamos que ela iria desaparecer em breve. Dito e feito. Uma mata rala, e logo uma mata fechada. Que dificuldade para dar cada passo. O rio naquele trecho era manso. A tarde veio chegando. Precisávamos de um lugar para arranchar. Sabíamos que não podíamos ficar próximo à margem. Pelos menos uns trezentos metros. As muriçocas nos comeriam vivos. Experiência de outras épocas.

                   A primeira noite foi calma e assim a segunda. Mas cada dia mais difícil ficava a caminhada. Na tarde do terceiro dia avistamos uma cachoeira enorme. Época da piracema. Um espetáculo a parte. Quem já viu sabe como é. Lindo! A luta dos peixes para subir rio acima é algum de espetacular. Escolhemos um belo piau de dois quilos e o Fumanchú nos fez uma gostoso assado de peixe na brasa. No dia seguinte demoramos mais de três horas para escalar a cachoeira. Não foi fácil. No quinto dia achávamos que estávamos atravessando o inferno. Que dificuldade meu Deus! Cada metro mais e mais um emaranhado da floresta. Naquele dia acho que não andamos cinco quilômetros. Se continuasse assim não chegaríamos a tal Garganta. No sexto dia a mata ficou rarefeita. Tiramos o atraso. Na manhã do sétimo dia avistamos a Garganta. Fácil de percorrer. Um gostoso riacho pedregoso e raso com águas límpidas. Na tarde daquele dia avistamos a famosa Floresta do Diabo. Imponente. Grandiosa. Misteriosa. Uma nevoa encobria o seu topo. Resolvemos dormir e prosseguir no outro dia.

                Levantamos cedo. Graças a Deus que durante os sete dias não choveu. Não foi preciso usar as lonas. Dormimos sob as estrelas. Pela manhã após um cafezinho partimos. Não havia como escolher uma local para a subida. Por toda parte arvores gigantescas e vegetação encobrindo tudo. Fomos em frente. Fumanchú nos disse que nossa ração daria para mais quatro dias. Se pudéssemos encontrar alguma caça ou pescar seria bom. Pescar ali não dava. A subida ficou íngreme. Três passos a frente um atrás. Quem sabe encontraríamos algumas frutas silvestres pensava enquanto andávamos. A mata fechada. Muito fechada. Começou a escurecer. Abrimos uma pequena clareira e dormimos, não antes de uma gostosa sopa de batata. Um bule de café nas brasas umas batatas doce e a noite chegou firme. Pegávamos no sono com facilidade.

               Acordei com o dia raiando. Vi o Romildo e o Fumanchú de pé, sem se mexer e olhando firme para frente. Tremi na base. Um índio enorme. Olhe mais de dois metros. Grande e sem ser gordo era descomunal. Cabeleira longa e totalmente branca. Sem barba. Olhos negros fitando-nos. Não disse nada. E agora, seria o tal Selvagem da Cabeça Branca? Vai nos esfolar e matar? Israel e Tãozinho se levantaram. Pedrinho sentou e se assustou. Era o menor de todos. Todos se aproximaram e ficamos juntos. Romildo o Monitor pegou seu bastão. Arma? Que nada, era leve e nem como porrete quebraria o galho. Calças começaram a ficar molhadas. Ele fez um sinal como dissesse – Venham comigo. Fazer o que? Juntamos nossas tralhas e fomos com ele.

                  Gente, o caminho era uma surpresa. Ele nos levou por uma encosta, onde uma trilha mínima e tendo como esteio um cipó enorme, atravessamos. Do outro lado uma pequena ponte pênsil que ele puxou não sei de onde, passamos e chegamos próximo a um platô, enorme. Avistamos algumas Ocas e uns vinte índios nos cercaram. A maioria mulheres e crianças. Ninguém falava nada, ninguém sorria. O tal da cabeça branca nos mandou entrar em uma oca. Enorme. Grande mesmo. Cabia lá toda a tribo isto é pensei que poderia ser uma. Um pequeno fogo no meio e que cheiro ruim. Ruim mesmo. De que seria? Romildo disse que mataram um porco do mato e ele estava em um canto da oca. Só podia ser ele. O tal da Cabeça Branca nos mandou sentar. Todos sentaram. Ele humildemente, o que estranhei começou a falar:

                 - Eu e os demais da tribo estamos pensando o que fazer com vocês. Não gostamos de estranhos. Eles nos fazem mal. Todos que aqui vem nós o matamos ou esfolamos. Um aviso para ninguém vir. Há muitas e muitas luas seus irmãos brancos mataram quase todos da minha tribo. Morávamos próximo a Aimorés, quase junto a Lagoa da Traíra. Éramos de paz. A sua FUNAI nos deu terras e fazendeiros nos tomaram. Uma noite entraram em nossa aldeia. Mataram quase todos. Eu, filho do cacique Lobo Branco, Pontiac filho do bravo Amanaki, Iraci minha namorada na tribo e filha de Caíare estávamos caçando. Quando chegamos vimos todos mortos e os brancos saqueando tudo. Nos escondemos. Levaram os corpos e os enterraram na entrada da Aldeia, mais de cinco quilômetros onde morávamos. Choramos muito. Mais cinco crianças correram até nós. Estavam vivos. Eu tinha dezesseis anos e era o mais velho. Resolvemos fugir.

                - Descobrimos esta floresta depois de dias de viagem pelo Rio Turvo. Achamos que quase ninguém viria aqui. Na Garganta Cajuru montamos um ponto para observar todos que se aproximam. Voces passaram por ela. Vimos todos os seus passos. São meninos como eu era. Sei que vieram por aventura. Eu também fui assim. Hoje somos menos de trinta. Iraci me deu oito filhos. Paramos. Não podemos crescer mais. Um livro sagrado foi escrito. Todos sabem o que diz lá. Aqui temos muita água e fizemos uma represa para criarmos peixes. Temos uma horta com muitas verduras. Conseguimos mudas de cana, de mandioca e de abóbora. É nosso sustento. Não queremos riquezas e aqui sabemos do ouro tão ambicionados por voces. Amanhã vamos decidir seus destinos. Ficarão na Oca de Pontiac. Não saiam de lá.

                 Saiu e fomos levado por Pontiac até sua morada. Custamos para dormir. Pela manhã eu já estava de pé quando uma indiazinha de uns doze anos entrou e disse que o Cacique Capotira (o tal da cabeça branca) nos chamava. Em uma roda de índios nos entregou nossas mochilas e algumas frutas. Disse que podíamos ir embora. Não pediu para ficarmos calados só disse que se contássemos a história da tribo e onde estávamos ele sabia que não iam durar muito. Deu a cada um uma pepita de ouro. – Façam o que quiserem. Pegamos nossas mochilas e partimos com ele a frente. Levou-nos até a Garganta Cajuru. Mostrou-nos muitas piteiras secas. Disse que com oito poderíamos descer o rio facilmente. Quando a corredeira aumentar saiam da água. A cachoeira esta próxima. Partimos.

                  Para dizer a verdade eu chorei. Gostei demais da tribo. Apesar de pouco tempo ficamos orgulhosos em conhecer todos. Cinco dias depois chegamos em Baixo Guandu. Eu, Romildo, Fumanchú, Taozinho, Israel e Pedrinho fizemos um juramento de não contar para ninguém. Foi uma das nossas maiores aventuras. Sempre quando acampávamos a noite em fogo de conselho ou em uma simples conversa ao pé do fogo, rememorávamos com saudades daquela aventura que ficou gravada em nossa mente para sempre. Os anos passaram e eu passei com eles. Há vinte anos atrás encontrei com Romildo. Sei que já foi para o grande acampamento. Disse-me que um dia soube pelos jornais a história da tribo dos Cabeças Brancas. O governo deu a eles as terras e nunca mais foram importunados por brancos.

                   Acampamentos, excursões, grandes aventuras. Elas ficam gravadas para sempre em nossa mente. Assim são os escoteiros. Não sabem se esconder em sede. Partem em buscas de suas aventuras. Seja ela simples, seja ela com grande perigo. Não importa. Eles sabem até podem ir. Saudades de Capotira, de Pontiac, de Iraci e daqueles amigos sinceros que fizemos. Espero que até hoje estejam felizes, pois lá em sua tribo sentiam-se libertos, e só o sol e a lua sabiam como a felicidade fazia parte de todos aqueles Cabeças Brancas. Quem sejam muito felizes. E as pepitas de ouro? Risos. Com ela papai terminou nossa casinha na Pastoril!

O amor vive de repetição. Cada um de nós tem, na existência, no mínimo uma grande aventura. O segredo da vida é reeditar essa aventura sempre que seja possível.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Vacina Bitipiniana para Chefes Escoteiros. (XP456).



Um comentário sem futuro.
Vacina Bitipiniana para Chefes Escoteiros. (XP456).

                Há tempos pensei que poderiam fazer uma vacina para chefes escoteiros e dirigentes. Claro, só para os que precisam. Os que já foram vacinados não. Tentei no Instituto Butantã. Não me levaram a sério. Peguei um avião da ponte aérea (fiquei quatro horas no Aeroporto de Congonhas e mais três no Galeão) e fui até o Bio-Manguinhos – Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos no Rio de Janeiro e nada. No Brasil acho que não ia encontrar nenhum, mas tentei a FUNED – Fundação Ezequiel Dias em Minas Gerais. Riram na minha cara e me chamaram de louco. Claro, podem achar que sim, pois nunca foram escoteiros. Só tinha uma saída, pegar um avião da Pan American e ir aos Estados Unidos. Desculpe, sei que a Pan pediu falência a muitos e muitos anos e olhem que diziam que os ônibus espaciais teriam seu logotipo no futuro, mas ela pelo menos tratava com fidalguia os escoteiros. Por isto viajei por ela. Seus diretores todos foram agraciados com a Eagle Scout e quando me viram de uniforme fui tratado como se fosse Baden Powell em pessoa. Minha nossa!

                Bem lá chegando procurei a BSA. Um prédio enorme. Um Executivo Escoteiro me recebeu com honras de Chefe Estado. Serviu uísque dos bons. Gosto de coisas boas e aquele Jack Daniels graças a Deus não era do Paraguay.  Adorei. Ele disse que se impressionou com meu uniforme caqui de calça curta e meu chapelão de três bicos. Achou que eu era o Escoteiro Chefe do Brasil! Risos. Eu? Só ele para achar isto. Preferi comentar que aqui no Brasil não tem Escoteiro Chefe, só presidentes e diretores. São muitos! E adoram seus cargos. Mas olhe apesar dos seus mais de dois milhões de escoteiros fiquei um pouco decepcionados com eles. O tal Executivo só falava nos mais de 5.000 profissionais que possuíam. No plano de metas para os quatro milhões de membros, em dobrar a receita atual (não me disse quanto) e fazer o maior Jamboree de todos os tempos. Totalmente de graça! Incríveis estes americanos. Neste eu acho que vou.

                Afinal entrei no assunto que me levou até lá. Me ouviu atentamente. Não riu e não chorou. Esta é a vantagem dos gringos. “Business-Business” Amigos, amigos, negócios a parte. Ainda bem. – Olhe eu disse, procuro uma vacina que contenha em sua fórmula o seguinte:
- Crescimento em qualidade e quantidade urgente para o Brasil;
- Mudança geral na maneira de pensar de todos os dirigentes;
- Aplicação correta do Sistema de Patrulhas;
- Organização urgente da Patrulha de Monitores;
- Abraços e beijos entre todos os adultos que atuam no escotismo deste o chefão ao chefinho;
- Abaixo assinado para voltarem às nomenclaturas antigas das provas de lobinhos e escoteiros;
- Cada Grupo Escoteiro no Brasil irá enviar um mínimo de cinco membros ao Congresso Nacional do próximo ano em Recife, pedindo e exigindo mudanças urgentes nos Estatutos e Regimento interno; Devem portar faixas e cartazes;
- Exigir que a partir de agora nenhuma decisão importante será tomada sem ampla informação discussão e apoio da maioria Escoteira;
- Uniforme único, exceto para os do mar e ar, pois são os únicos que mantiveram a tradição;

                 Ele me interrompeu. – Pode parar “Mister”. Pode parar. Se conheço bem o Brasil isto é impossível. Temos até uma vacina, mas nunca serviria para vocês. Mas não quero ensinar nada e se o fosse fazer só com seu representante internacional voces tem não? Sei que ele viaja muito! Risos. Até ele sabia disto!
           
                Saí de lá decepcionado. Valeu conhecer a sede da BSA mais nada. Onde conseguiria esta vacina? Quem sabe o Papa poderia me ajudar? Ou mesmo o Obama? Ou a ministra alemã Ângela Merkel? Dizem que ela é durona. Do russo Vladimir Putin sabia que não podia esperar nada Peguei de volta um avião da GOL. Tive que pagar o lanche de bordo, que coisa né? Vi que as aeromoças me tratavam com carinho, pois acho que algumas delas tinham sido bandeirantes. Mandaram apertar o cinto. O avião começou a sacolejar e trepidar. Alguns gritaram pedindo socorro. Começou a rodar em parafuso. Um velhinho simpático me apareceu e disse – Calma meu Chefe, você vai ficar bem. Vou levar você para o Grande Acampamento no além. Gritei! Deus me livre! Chega de velhos. De "Velho" já basta eu. Ele sorriu e disse - Tudo bem irei comentar com o Senhor Baden Powell sua recusa e pode esperar que será julgado pela Comissão de Ética aqui do céu. Ela é pior que a terráquea. Não espere piedade!

               Acordei suando e gritando. Celia veio correndo. Sorri sem graça, apenas um pesadelo mulher, apenas um pesadelo! Maldita vacina. Não quero pensar nela nunca mais! 

domingo, 7 de outubro de 2012

Lendas escoteiras. O Selvagem das Terras Altas – Parte I.


Lendas escoteiras.
O Selvagem das Terras Altas – Parte I.

                Se havia algum que me deixava deprimido era não poder fazer alguma atividade que por um motivo ou outro pensei em fazer. Nunca em minha vida tive medo de enfrentar a estrada, as matas, as campinas, os rios estreitos e largos, as cachoeiras, as corredeiras infernais e até as mais altas montanhas. Me deliciava quando conseguia conquistar cumes imensos, atravessar rios caudalosos seja de que maneira for descendo corredeiras ou mesmo encontrar com o imponderável pela frente era motivo de orgulho. Não sei quantas vezes passei por isto. Medo? Um pouco. Muitas vezes “molhei as calças” e não me envergonho de dizer. O que me deixava agora chateado era não encontrar alguém da Patrulha para ir comigo. Estava enfezado. Israel disse que não podia – Bitelô, como vou ficar vinte dias fora? – Tãozinho então – Nem posso pensar nisto Bitelô, meu pai não vai deixar nunca. E assim um por um não encontrei ninguém que topasse enfrentar um desafio novo.

               Tudo começou quando fui cortar o cabelo na Barbearia do seu Praxedes. Era o barbeiro do meu pai há muitos anos. Eu cortava cabelo com ele desde os cinco. Ele sempre soube o que fazer e como era o corte. Estava lá entretido quando entrou um sujeito com um bigode que nunca tinha visto um igual. Enorme. Diria que os lados quase alcançavam ao queixo. Passou um tempo e ele começou a conversar com o seu Praxedes e conversa vai conversa vem disse que morava na Morada do Morto Vivo. Nunca ouvi falar. Seu Praxedes balançou a cabeça. Contou então a história mais incrível que tinha ouvido. Disse que bem longe de sua casa, bem ao norte subindo o Rio Turvo, quem sabe duas semanas a pé, existia uma serra alta, toda tomada por uma imensa floresta. Ninguém ainda tinha entrado nela. Era completamente desconhecida. Um dia um homem todo marcado e sangrando como se tivesse sido esfolado vivo chegou a sua porta pedindo ajuda e socorro. Trataram dele dentro do que conheciam e no quinto dia ele partiu. Quando ia virando a curva da Trilha da Goiabeira gritou – Nunca tentei entrar na Floresta do Diabo! Lá ainda mora o Selvagem da Cabeça Branca. Ele não conversa com ninguém. Ele esfola e mata. E sumiu junto as plantação de figo que tínhamos acabado de plantar.

              Depois não falou mais. Cortou o cabelo aparou o bigode e quando ia saindo o segurei pelo braço. Ele me olhou e vi nos seus olhos faiscarem. Conhecia este tipo de valentia de outras eras quando das minhas brigas eternas e quase desisti de perguntar. – Moço, como faço para chegar na Floresta do Diabo? Ele riu. Pegue o trem. Desça em Baixo Guandu. Suba o Rio Turvo por oitenta quilômetros. Quando avistar uma garganta entre duas montanhas, vá por baixo mais vinte quilômetros. Quando ela terminar irá ver uma imensa floresta subindo aos céus e densa por causa do nevoeiro. É lá. Mas menino, nunca vá lá. O Selvagem da Cabeça Branca dizem nunca deixou ninguém vivo e os que conseguiram fugir ficaram com sequelas no corpo morrendo em poucos meses. Me virou as costas e sumiu na Rua do Sumidouro e nunca mais o vi. À noite minha patrulha tinha marcado uma reunião na sede. Pretendíamos acampar nas férias de julho e poderíamos escolher um bom local e quem sabe fazer as grandes pioneirias que sempre planejamos e não fizemos. Poderíamos ficar oito dias acampados.
  
               Enquanto todos discutiam lembrei da conversa do Homem do Bigode Rastapé que me contou a história fantástica. Contei para a Patrulha. Riram e não deram atenção. Tentei de todo modo motivar a irmos lá. Foi Israel que colocou a questão crucial – Olhe Bitelô, Oitenta quilômetros rio acima, depois mais vinte. Você sabe. Sem trilhas, matas dos dois lados e com corredeiras tem de ser a pé. Pelos meus cálculos não conseguiremos andar mais que vinte quilômetros por dia, e olhe lá. Só aí seriam cinco dias para ir e mais cinco para voltar. Nem sabemos o que vamos encontrar. Claro que na volta uma jangada pode nos trazer mais rápido, mas e então? Subir uma montanha que ninguém nunca subiu? E se for verdade esta historia do tal Selvagem esfolador? Não somos heróis. Nem sabemos o que vamos encontrar.

               Tentei de todo modo motivar a turma. Nada estava conseguindo convencer aqueles seniores destemidos. Deram todo tipo de desculpa. Parece que não era a minha Patrulha que não enjeitava nenhum desafio. Voltei para casa frustrado. No dia seguinte Pedrinho me procurou em casa – Olhe Bitelô, não dormi a noite. Só pensando nesta história do esfolador. Encontrei com o Israel e ele me disse a mesma coisa. Acho que devemos nos reunir hoje na sede e conversar de novo sobre isto. Dito e feito. A Patrulha conversou por horas. No final tudo planejado. Achávamos que quinze dias seriam suficientes. Os seis valentes seniores da patrulha Cascavel iriam entrar em ação novamente. Que nos esperasse a Floresta do Diabo. E que se danasse o Selvagem da Cabeça Branca. Ele ia conhecer uma turma da pesada! A aventura ia começar e que aventura foi meu Deus!

Continua em qualquer dia da semana a parte II. Aguardem. Risos.