Uma linda historia escoteira

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Era uma vez...

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Quinzinho, um amigo de verdade.



Conversa ao pé do fogo.
Quinzinho, um amigo de verdade.

                           - Eu juro palavra de Escoteiro que não fui eu! – Mas você estava lá, disse que não podia ir conosco, pois estava com o pé doendo, se ofereceu para tomar conta do campo na nossa ausência. Nós confiamos em você e agora disse que dormiu? – Tico, por favor, eu dormi um soninho de nada! – Tico olhou para os outros Monitores e para o Chefe Darli. Ele mesmo como presidente da Corte de Honra não sabia que atitude tomar. Estavam em reunião da Corte há mais de uma hora. Marlon sempre foi um bom Escoteiro. Mais de dois anos na tropa, mas por duas vezes em um acampamento na fazenda do Seu Jorginho alguém entrou no acampamento e roubou todos os víveres. Tiveram de voltar. Na primeira vez Marlon deu a mesma desculpa, mas duas vezes é demais. – Espere lá fora Marlon. Vamos deixar a Corte de Honra decidir. Chefe Darli não dizia nada. Deixava que os Monitores tomassem as decisões a não ser quando ele via que alguém poderia ser prejudicado o que não era o caso.

                              Meia hora depois Marlon foi chamado. – Foi Tico quem deu a sentença – Marlon, infelizmente você foi suspenso por trinta dias. Achamos que não foi você quem tirou os mantimentos, mas alguém foi e por sua culpa. A tropa Escoteira ficou desolada. Acharam que Marlon não merecia a suspensão. Mas o Chefe Darli explicou que cada um de nós temos que assumir nossas responsabilidades e se algum acontecer não podemos fugir as nossas  culpas. Eu estava como Sênior na época. Tinha seis meses que fizera a passagem. – Quem seria o culpado? Quem tirou os mantimentos? – Metido a detetive, pois naquela época começaram a pipocar nas bancas livros de bolso e eu um leitor inveterado achei que tinha por obrigação de descobrir. Primeiro – Os roubos foram todos na Fazenda do Seu Jorginho. Segundo -  Marlon acampou em outros lugares e nada aconteceu. Terceiro - O local era longe da fazenda e impossível alguém de lá ir ao campo para isto. Quarto, melhor ir lá acampar e ver. Dito e feito. Mochila nas costas eu e o Gentil partimos em uma sexta a noite com as nossas bicicletas.

                            Combinamos eu e o Gentil o que fazer. Barraca armada, intendência pronta, toldos nos lugares e o Gentil partiu como se fosse fazer uma jornada de Primeira Classe. Eu fiquei encostado em uma seringueira a dormitar. Ou seja, fingia dormitar. Caramba! E não é que dormi mesmo? Acordei com tudo mexido na intendência. As linguiças, a farinha, meia dúzia de bananas, quatro laranjas, feijão cozido (levamos de casa) tinham desaparecido. Gentil não deu trégua. - O detetive de araque dormiu? - Fazer o que. Em volta da intendência nenhuma pista. Procurei até o bosque e nada. Voltamos para a cidade. Na semana seguinte voltamos. Eu não era de desistir fácil. À tarde, sonolento (fingindo) fui deitar na sombra da seringueira. E foi então que avistei o famigerado ladrão de comida. Desta vez ele não ia escapar. Atrás do bosque ele veio de mansinho, cabeça baixa, levantando e abaixando como se estivesse cansado. Nada mais nada menos que um Macaquinho carvoeiro. Um pobre coitado, magro pelagem caindo e um olhar triste, pois só andava de cabeça baixa.

                            Não caminhava em linha reta. Parecia não ver o caminho ou como se estivesse com sono. Entrou na intendência e eu atrás. Peguei-o pelo rabo. Guinchou alto. Um berreiro tremendo, tentou correr e se soltou da minha mão. Correu a esmo e bateu a cabeça em uma árvore na entrada do bosque. Porque não subiu em uma árvore? Pensei. Ele ficou grogue. Levei-o no colo até ao acampamento. Gentil chegou e deu belas risadas do ladrão de comida. – Melhor soltá-lo, veja – disse – está sozinho e seu bando? Realmente ele estava só. Nessa hora acordou. Levantou e vi em seus olhos manchados de vermelho que ele não olhava para mim. Só para os lados se virando sem parar. – Cego! Isto mesmo. O macaquinho era cego. Abandonado pelos seus. No bando se não podia se virar não podia ficar.

                            Resolvemos ajudar. O levei para minha casa. Foi sem reclamar. Dócil muito dócil. Havia uma seringueira enorme. Ele adorou. Todos os dias dava para ele um pouco de arroz e feijão, bananas e laranjas. Ele adorava. No sábado na reunião comuniquei ao Chefe Darli quem era o ladrão. Ele sorriu – Olhe Vado, eu sabia que o Marlon não tinha roubado comida. Isto não. Mas ele foi negligente. Isto um dia poderia prejudicar muitas pessoas. Melhor ele aprender agora a ser responsável com suas obrigações. Concordei com o Chefe. Levei Quinzinho (novo nome que eu e o Gentil colocamos nele) o macaquinho para a sede. Nós os seniores construímos um ninho de águia para ele em duas mangueiras que existiam lá. Paradoxo, um macaco em um ninho de águia. Todos nós levávamos comida para ele. Precisavam o ver nas reuniões, pulava, guinchava, gruía e fazia mil piruetas. Mesmo cego sabia que tinha amigos protetores. O seu bando o deixou e o bando dos escoteiros o adotou.

                        Aprendeu de tudo. Ensinaram-no a fazer a saudação. Vinham pessoas da cidade só para o ver fazendo a saudação, marchar, pular nos gritos de Patrulha. Ele conquistou um amigo, o maior amigo que já teve. Nada mais nada menos que Marlon. Sei que no Grupo Escoteiro ele ficou até morrer quinze anos depois. Nunca voltou a enxergar, mas agora sabia que seriam seus amigos. Estava em casa. Vivia feliz. Tinha uma nova família. Eu mesmo fiquei pouco tempo no Grupo Escoteiro. Meu pai doente foi para a capital e eu fui também. Mas sempre recebia uma carta, um telegrama falando de Quinzinho. Soube que ele não perdia um acampamento ou atividade extra sede. Acredito que todos que o conheceram nunca o esqueceram. Assim como foi comigo acredito que ficou gravado no coração de todos os escoteiros que o conheceram.

                       Ops! Não posso esquecer. Marlon juntou dinheiro, muito na época e comprou uma macaquinha fêmea que dizem jurou fidelidade para sempre a Juquinha. Que os digam o Prince, Caledônio, Naninha e a própria esposa Juquita, quatro macacos carvoeiros que pelas noticias que recebo estão morando na sede até hoje!     

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