Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Conversa ao pé do fogo. A última Estação de trem. Tempos são passados. Só as lembranças ficaram. Tempos bons que não voltam mais. Ainda fazia minhas jornadas e meus acampamentos a “escoteira”, para quem não sabe significa aquele que anda só. Era um apaixonado por ficar só, sem dividir o vento no rosto, a sombra de uma pitangueira, ou o remanso frio de um riacho. Egoísta? Não. Junto aos meus amigos fizemos belos acampamentos, belas excursões que também tem seu lugarzinho em um cantinho da minha memória. Meus problemas eu resolvia assim. Uma mochila, um bornal, uma forquilha, ração B, uma rota e pé na estrada. Adorava. Muitas vezes sem barracas. Montar uma cabana, um banquinho, um fogo estrela, um local privilegiado onde a vista pudesse deslumbrar o inatingível. Quantas vezes? Muitas. Paradas longínquas, picos saudosos, vales queridos, uma jangada a descer o rio desconhecido. Muitas histórias. Várias que um dia quem sabe irei contando uma a uma. Desta não esqueço. Aconteceu no início da década de sessenta. Bandeiras ao vento e lá ia eu. Diziam ser uma floresta virgem onde poucos entraram. Meu habitat. Um trem, uma trilha, e a floresta linda a convidar para conhecê-la. Dois dias. Animais enormes, pássaros floridos e cantantes aos milhares, corujas buraqueiras espantadas com meu cantar noturno a beira de um pequeno fogo naquela clareira amiga. Os ruídos da noite a estalar na audição de um Velho mateiro. Vida sublime. Sonhos refeitos, alegre pela mente fértil hora da meia volta. Um retorno sem faltar um banho em um riacho que jorrava cascatas com suas águas nas pedras brancas criando espumas gostosas para afundar e levantar sentindo o sabor daquelas águas que nunca foram tocadas. Tudo que é bom não dura para sempre. Já me disseram que nada é para sempre. O retorno sempre é tristonho. Uma pequena estação. Não era uma cidade, quem sabe um arraial. Meia dúzia de casas. Só o trem expresso não para. Os outros ficam ali a soltar fumaça na chaminé de uma Baldwin que nunca se cansava. Cheguei cedo. Gostava de ver o andar do Chefe da Estação. Educado. - Boa tarde! E tirava o quepe como a me saudar sem me conhecer. Ao lado uma mesa com a parafernália eletromagnética que Morse um dia inventou, as mensagens enviadas pelo telegrafista percorriam como correio eletrônico os milhares de quilômetros daquela ferrovia sem fim. Diziam eu não sei que chegava até o fim do mundo! Eu podia ouvir os sinais curtos e longos, pois um dia quando criança enfrentei a batalha de ser um Sinaleiro. Sentado em um banco na plataforma da estação eu esperava. Não tinha pressa. Nunca tive. Muitas vezes um olhar corre mais rápido que um raio no céu. A vista fora o rio caudaloso era comum após as diversas linhas de ida e volta. A plataforma vazia. O trem que subia o rio chegou mansamente. Não era o meu. Eu iria descer o rio. O Chefe da Estação com seu arco a dar suas instruções ao maquinista que treinado não teve duvidas para enlaçar. O barulho quieto da fornalha soltando fumaça e ar quente. Eu adorava aquilo. Estava ali sentado como hipnotizado com a beleza de uma trem de ferro que sumiu para sempre nas esquinas da vida. Foi então que avistei um casal. Jovens. Parados em frente à entrada do vagão de primeira classe. Um olhando para o outro. Não diziam nada. Ela só tinha olhos para ele. Encharcados de lágrimas de amor. Ele tristonho também não tirava os olhos dela. – Eu volto para te buscar ele disse. Ela chorava baixinho. – Nunca vou esquecer-me de você meu amor. O último apito, um beijo simples, um roçar de lábios sedentos que não queriam se separar. O trem deslizando sobre os trilhos se despedia da estação sorrindo ao pensar que outra lá ao longe estava à espera dele. Um último adeus. Ele correu e subiu nos degraus de seu vagão. Ficou ali de mãos estendidas como a dizer um adeus para sempre. Ela sabia disto. Sabia que ele não iria voltar. Em pé olhava o trem apitando até sumir de vista na curva do rio. Um silêncio tomou conta da plataforma. Eu só ouvia o tic tac do telegrafo e os soluços da bela moça que havia perdido seu amor. Eu nada dizia. Não tinha nada para dizer. Ela estática não saia do lugar. Perdidos em uma estação de trem o mundo dela desmoronava. O meu chorava com ela. Ela se virou e me viu. Seus olhos estavam marejados de lágrimas. Eu de calças curtas com meu chapelão fiquei em pé. Queria me solidarizar. Não sabia como fazer. Ela deu um pequeno sorriso levantando o braço dizendo baixinho “Sempre Alerta”. Respondi do mesmo modo em posição de sentido. Lentamente ela se foi para seu destino. De novo a estação vazia. O sol do outro lado do rio teimava em se esconder na montanha. Não havia vento, nem uma leve brisa para trazer alguma notícia do meu trem. Sentei novamente e deixei minha mente viajar por este mundo de Deus. O Chefe do Trem se aproximou. – Um atraso de quatro horas. O Trem que subia desencarrilhou. Muitos feridos. O Trem que iria descer não tinha como passar. Não disse nada. Não tinha pressa. Minha mente corria sobre os trilhos a procurar o trem que se foi. - Será que ele sobreviveu? Sem resposta. E ela? Como avisar que seu amor poderia ter ido para o outro lado da vida? – Não tem como dizer. Ela se foi para sua morada sonhando com seu amor e sabendo que ele nunca mais iria voltar. Quem sabe é melhor assim. Dormitei no banco da estação. A noite chegou. A plataforma escura deu para ver alguns trovões no céu. A chuva chegou de mansinho. Não havia mais trovões e nem raios no céu. Eu gosto do som da chuva. Ela me trás uma paz e tranquilidade que revigora. Ao longe um apito do trem. Era o meu que chegava. Como um pássaro gigante sobre trilhos adentrou na estação perdida de um trecho qualquer. Um retorno sem consequências. Na minha morada meu amor dormia. Entrei de mansinho. Fui olhar meus filhos que adormecidos sonhavam com anjos do céu. Abracei minha amada de muitas vidas que estava ali ao meu lado. Ela sorriu. Pensei no amor da outra que tinha ido para sempre. Sina marcada. Destino escrito no livro da vida. Nada do que tem de ser muda. Sonhos que não foram vividos. Estrelas piscantes que se mantém no universo através dos tempos. Esperanças que nunca se acabam. Ainda deitado com as mãos entrelaçadas no peito eu lembrei-me de um verso de um lindo poema de JG de Araújo Jorge – “Gota d’água brilhante, ainda suspenso num fio... Quando o sol quente a encontrou, partida que não teve o adeus de um lenço, história antiga que não tem mais senso, livro que o vento sem querer fechou”! Nota – J.G de Araújo Jorge escreveu centenas de poemas. A estrofe escrita no final do conto é de seu poema Carta Inútil. Por sinal um dos mais bonitos que escreveu.



Conversa ao pé do fogo.
Conversa ao pé do fogo.
A última Estação de trem.

                   Tempos são passados. Só as lembranças ficaram. Tempos bons que não voltam mais. Ainda fazia minhas jornadas e meus acampamentos a “escoteira”, para quem não sabe significa aquele que anda só. Era um apaixonado por ficar só, sem dividir o vento no rosto, a sombra de uma pitangueira, ou o remanso frio de um riacho. Egoísta? Não. Junto aos meus amigos fizemos belos acampamentos, belas excursões que também tem seu lugarzinho em um cantinho da minha memória. Meus problemas eu resolvia assim. Uma mochila, um bornal, uma forquilha, ração B, uma rota e pé na estrada. Adorava. Muitas vezes sem barracas. Montar uma cabana, um banquinho, um fogo estrela, um local privilegiado onde a vista pudesse deslumbrar o inatingível. Quantas vezes? Muitas. Paradas longínquas, picos saudosos, vales queridos, uma jangada a descer o rio desconhecido.

                  Muitas histórias. Várias que um dia quem sabe irei contando uma a uma. Desta não esqueço. Aconteceu no início da década de sessenta. Bandeiras ao vento e lá ia eu. Diziam ser uma floresta virgem onde poucos entraram. Meu habitat. Um trem, uma trilha, e a floresta linda a convidar para conhecê-la. Dois dias. Animais enormes, pássaros floridos e cantantes aos milhares, corujas buraqueiras espantadas com meu cantar noturno a beira de um pequeno fogo naquela clareira amiga. Os ruídos da noite a estalar na audição de um Velho mateiro. Vida sublime. Sonhos refeitos, alegre pela mente fértil hora da meia volta. Um retorno sem faltar um banho em um riacho que jorrava cascatas com suas águas nas pedras brancas criando espumas gostosas para afundar e levantar sentindo o sabor daquelas águas que nunca foram tocadas.

                  Tudo que é bom não dura para sempre. Já me disseram que nada é para sempre. O retorno sempre é tristonho. Uma pequena estação. Não era uma cidade, quem sabe um arraial. Meia dúzia de casas. Só o trem expresso não para. Os outros ficam ali a soltar fumaça na chaminé de uma Baldwin que nunca se cansava. Cheguei cedo. Gostava de ver o andar do Chefe da Estação. Educado. - Boa tarde! E tirava o quepe como a me saudar sem me conhecer. Ao lado uma mesa com a parafernália eletromagnética que Morse um dia inventou, as mensagens enviadas pelo telegrafista percorriam como correio eletrônico os milhares de quilômetros daquela ferrovia sem fim. Diziam eu não sei que chegava até o fim do mundo! Eu podia ouvir os sinais curtos e longos, pois um dia quando criança enfrentei a batalha de ser um Sinaleiro. Sentado em um banco na plataforma da estação eu esperava. Não tinha pressa. Nunca tive. Muitas vezes um olhar corre mais rápido que um raio no céu.  A vista fora o rio caudaloso era comum após as diversas linhas de ida e volta.

                A plataforma vazia. O trem que subia o rio chegou mansamente. Não era o meu. Eu iria descer o rio. O Chefe da Estação com seu arco a dar suas instruções ao maquinista que treinado não teve duvidas para enlaçar. O barulho quieto da fornalha soltando fumaça e ar quente. Eu adorava aquilo. Estava ali sentado como hipnotizado com a beleza de uma trem de ferro que sumiu para sempre nas esquinas da vida. Foi então que avistei um casal. Jovens. Parados em frente à entrada do vagão de primeira classe. Um olhando para o outro. Não diziam nada. Ela só tinha olhos para ele. Encharcados de lágrimas de amor. Ele tristonho também não tirava os olhos dela. – Eu volto para te buscar ele disse. Ela chorava baixinho. – Nunca vou esquecer-me de você meu amor. O último apito, um beijo simples, um roçar de lábios sedentos que não queriam se separar.

              O trem deslizando sobre os trilhos se despedia da estação sorrindo ao pensar que outra lá ao longe estava à espera dele.  Um último adeus. Ele correu e subiu nos degraus de seu vagão. Ficou ali de mãos estendidas como a dizer um adeus para sempre. Ela sabia disto. Sabia que ele não iria voltar. Em pé olhava o trem apitando até sumir de vista na curva do rio. Um silêncio tomou conta da plataforma. Eu só ouvia o tic tac do telegrafo e os soluços da bela moça que havia perdido seu amor. Eu nada dizia. Não tinha nada para dizer. Ela estática não saia do lugar. Perdidos em uma estação de trem o mundo dela desmoronava. O meu chorava com ela. Ela se virou e me viu. Seus olhos estavam marejados de lágrimas. Eu de calças curtas com meu chapelão fiquei em pé. Queria me solidarizar. Não sabia como fazer. Ela deu um pequeno sorriso levantando o braço dizendo baixinho “Sempre Alerta”. Respondi do mesmo modo em posição de sentido. Lentamente ela se foi para seu destino.

               De novo a estação vazia. O sol do outro lado do rio teimava em se esconder na montanha. Não havia vento, nem uma leve brisa para trazer alguma notícia do meu trem. Sentei novamente e deixei minha mente viajar por este mundo de Deus. O Chefe do Trem se aproximou. – Um atraso de quatro horas. O Trem que subia desencarrilhou. Muitos feridos. O Trem que iria descer não tinha como passar. Não disse nada. Não tinha pressa. Minha mente corria sobre os trilhos a procurar o trem que se foi. - Será que ele sobreviveu? Sem resposta. E ela? Como avisar que seu amor poderia ter ido para o outro lado da vida? – Não tem como dizer. Ela se foi para sua morada sonhando com seu amor e sabendo que ele nunca mais iria voltar. Quem sabe é melhor assim. Dormitei no banco da estação. A noite chegou. A plataforma escura deu para ver alguns trovões no céu.

             A chuva chegou de mansinho. Não havia mais trovões e nem raios no céu. Eu gosto do som da chuva. Ela me trás uma paz e tranquilidade que revigora. Ao longe um apito do trem. Era o meu que chegava. Como um pássaro gigante sobre trilhos adentrou na estação perdida de um trecho qualquer. Um retorno sem consequências. Na minha morada meu amor dormia. Entrei de mansinho. Fui olhar meus filhos que adormecidos sonhavam com anjos do céu. Abracei minha amada de muitas vidas que estava ali ao meu lado. Ela sorriu. Pensei no amor da outra que tinha ido para sempre. Sina marcada. Destino escrito no livro da vida. Nada do que tem de ser muda. Sonhos que não foram vividos. Estrelas piscantes que se mantém no universo através dos tempos. Esperanças que nunca se acabam. Ainda deitado com as mãos entrelaçadas no peito eu lembrei-me de um verso de um lindo poema de JG de Araújo Jorge – “Gota d’água brilhante, ainda suspenso num fio... Quando o sol quente a encontrou, partida que não teve o adeus de um lenço, história antiga que não tem mais senso, livro que o vento sem querer fechou”!

Nota – J.G de Araújo Jorge escreveu centenas de poemas. A estrofe escrita no final do conto é de seu poema Carta Inútil. Por sinal um dos mais bonitos que escreveu.

                   Tempos são passados. Só as lembranças ficaram. Tempos bons que não voltam mais. Ainda fazia minhas jornadas e meus acampamentos a “escoteira”, para quem não sabe significa aquele que anda só. Era um apaixonado por ficar só, sem dividir o vento no rosto, a sombra de uma pitangueira, ou o remanso frio de um riacho. Egoísta? Não. Junto aos meus amigos fizemos belos acampamentos, belas excursões que também tem seu lugarzinho em um cantinho da minha memória. Meus problemas eu resolvia assim. Uma mochila, um bornal, uma forquilha, ração B, uma rota e pé na estrada. Adorava. Muitas vezes sem barracas. Montar uma cabana, um banquinho, um fogo estrela, um local privilegiado onde a vista pudesse deslumbrar o inatingível. Quantas vezes? Muitas. Paradas longínquas, picos saudosos, vales queridos, uma jangada a descer o rio desconhecido.

                  Muitas histórias. Várias que um dia quem sabe irei contando uma a uma. Desta não esqueço. Aconteceu no início da década de sessenta. Bandeiras ao vento e lá ia eu. Diziam ser uma floresta virgem onde poucos entraram. Meu habitat. Um trem, uma trilha, e a floresta linda a convidar para conhecê-la. Dois dias. Animais enormes, pássaros floridos e cantantes aos milhares, corujas buraqueiras espantadas com meu cantar noturno a beira de um pequeno fogo naquela clareira amiga. Os ruídos da noite a estalar na audição de um Velho mateiro. Vida sublime. Sonhos refeitos, alegre pela mente fértil hora da meia volta. Um retorno sem faltar um banho em um riacho que jorrava cascatas com suas águas nas pedras brancas criando espumas gostosas para afundar e levantar sentindo o sabor daquelas águas que nunca foram tocadas.

                  Tudo que é bom não dura para sempre. Já me disseram que nada é para sempre. O retorno sempre é tristonho. Uma pequena estação. Não era uma cidade, quem sabe um arraial. Meia dúzia de casas. Só o trem expresso não para. Os outros ficam ali a soltar fumaça na chaminé de uma Baldwin que nunca se cansava. Cheguei cedo. Gostava de ver o andar do Chefe da Estação. Educado. - Boa tarde! E tirava o quepe como a me saudar sem me conhecer. Ao lado uma mesa com a parafernália eletromagnética que Morse um dia inventou, as mensagens enviadas pelo telegrafista percorriam como correio eletrônico os milhares de quilômetros daquela ferrovia sem fim. Diziam eu não sei que chegava até o fim do mundo! Eu podia ouvir os sinais curtos e longos, pois um dia quando criança enfrentei a batalha de ser um Sinaleiro. Sentado em um banco na plataforma da estação eu esperava. Não tinha pressa. Nunca tive. Muitas vezes um olhar corre mais rápido que um raio no céu.  A vista fora o rio caudaloso era comum após as diversas linhas de ida e volta.

                A plataforma vazia. O trem que subia o rio chegou mansamente. Não era o meu. Eu iria descer o rio. O Chefe da Estação com seu arco a dar suas instruções ao maquinista que treinado não teve duvidas para enlaçar. O barulho quieto da fornalha soltando fumaça e ar quente. Eu adorava aquilo. Estava ali sentado como hipnotizado com a beleza de uma trem de ferro que sumiu para sempre nas esquinas da vida. Foi então que avistei um casal. Jovens. Parados em frente à entrada do vagão de primeira classe. Um olhando para o outro. Não diziam nada. Ela só tinha olhos para ele. Encharcados de lágrimas de amor. Ele tristonho também não tirava os olhos dela. – Eu volto para te buscar ele disse. Ela chorava baixinho. – Nunca vou esquecer-me de você meu amor. O último apito, um beijo simples, um roçar de lábios sedentos que não queriam se separar.

              O trem deslizando sobre os trilhos se despedia da estação sorrindo ao pensar que outra lá ao longe estava à espera dele.  Um último adeus. Ele correu e subiu nos degraus de seu vagão. Ficou ali de mãos estendidas como a dizer um adeus para sempre. Ela sabia disto. Sabia que ele não iria voltar. Em pé olhava o trem apitando até sumir de vista na curva do rio. Um silêncio tomou conta da plataforma. Eu só ouvia o tic tac do telegrafo e os soluços da bela moça que havia perdido seu amor. Eu nada dizia. Não tinha nada para dizer. Ela estática não saia do lugar. Perdidos em uma estação de trem o mundo dela desmoronava. O meu chorava com ela. Ela se virou e me viu. Seus olhos estavam marejados de lágrimas. Eu de calças curtas com meu chapelão fiquei em pé. Queria me solidarizar. Não sabia como fazer. Ela deu um pequeno sorriso levantando o braço dizendo baixinho “Sempre Alerta”. Respondi do mesmo modo em posição de sentido. Lentamente ela se foi para seu destino.

               De novo a estação vazia. O sol do outro lado do rio teimava em se esconder na montanha. Não havia vento, nem uma leve brisa para trazer alguma notícia do meu trem. Sentei novamente e deixei minha mente viajar por este mundo de Deus. O Chefe do Trem se aproximou. – Um atraso de quatro horas. O Trem que subia desencarrilhou. Muitos feridos. O Trem que iria descer não tinha como passar. Não disse nada. Não tinha pressa. Minha mente corria sobre os trilhos a procurar o trem que se foi. - Será que ele sobreviveu? Sem resposta. E ela? Como avisar que seu amor poderia ter ido para o outro lado da vida? – Não tem como dizer. Ela se foi para sua morada sonhando com seu amor e sabendo que ele nunca mais iria voltar. Quem sabe é melhor assim. Dormitei no banco da estação. A noite chegou. A plataforma escura deu para ver alguns trovões no céu.

             A chuva chegou de mansinho. Não havia mais trovões e nem raios no céu. Eu gosto do som da chuva. Ela me trás uma paz e tranquilidade que revigora. Ao longe um apito do trem. Era o meu que chegava. Como um pássaro gigante sobre trilhos adentrou na estação perdida de um trecho qualquer. Um retorno sem consequências. Na minha morada meu amor dormia. Entrei de mansinho. Fui olhar meus filhos que adormecidos sonhavam com anjos do céu. Abracei minha amada de muitas vidas que estava ali ao meu lado. Ela sorriu. Pensei no amor da outra que tinha ido para sempre. Sina marcada. Destino escrito no livro da vida. Nada do que tem de ser muda. Sonhos que não foram vividos. Estrelas piscantes que se mantém no universo através dos tempos. Esperanças que nunca se acabam. Ainda deitado com as mãos entrelaçadas no peito eu lembrei-me de um verso de um lindo poema de JG de Araújo Jorge – “Gota d’água brilhante, ainda suspenso num fio... Quando o sol quente a encontrou, partida que não teve o adeus de um lenço, história antiga que não tem mais senso, livro que o vento sem querer fechou”!


Nota – J.G de Araújo Jorge escreveu centenas de poemas. A estrofe escrita no final do conto é de seu poema Carta Inútil. Por sinal um dos mais bonitos que escreveu.

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