Conversa
ao pé do fogo.
Escolha,
ou o escotismo ou eu!
Ao chegar à casa do
"Velho" Escoteiro naquele domingo fiquei surpreso. Lá estava ele de
uniforme, o seu Velho caqui de guerra que ele adorava. – Sorri, pois mesmo com
seus 86 anos ele ainda fazia bela figura. Sempre um exemplo envergando o
uniforme. Ele diferente da sua rotina me cumprimentou normalmente. Não estava
com semblante carregado sinal que o dia estava sendo promissor. Sentamos na
sala grande e uma melodia silenciosa nos trazia uma paz gostosa. Reconheci
Edward Simoni, um dos meus preferidos. – Hoje tirei o dia pra meditar disse –
Pensei em tantas coisas e parei no entusiasmo do novo e até do velho Chefe.
Observe a alegria demonstrada por muitos que participam do movimento. São jovens,
adultos e nem sempre sabemos se a alegria é só dele ou de toda sua família.
Ontem mesmo esteve aqui um Escotista e ficamos conversando horas. Conversa
interessante. Ele mesmo vítima do escotismo. Separou da família graças ao sua
dedicação ao Movimento Escoteiro. Acontece muito com chefes novos e antigos.
Nem sempre sua família aceita participar e ele diferente dos demais, mantém um
enorme entusiasmo e maior ainda quando um filho ou uma filha estiver engajado
com ele.
Eu acompanhava o raciocínio do Velho
Escoteiro. Conhecia alguns chefes com graves problemas em família por causa do
escotismo. Um tema que poucos comentam. Sempre vemos o lado bom, o Chefe
sorridente com a esposa, os filhos todos uniformizados e o outro aquele que vai
só aprendemos a escondê-lo atrás da porta. – O Velho Escoteiro me olhou e como
sempre adivinhando o meu pensamento continuou – É comum, o adulto quando entra
se motivar de tal maneira que esquece que sua cara metade ou alguém de sua
família não pensa como ele. Sabemos que o conceito básico da família é formada
a partir da união de pai, mãe e filhos. Quando um deles assume uma
personalidade que acredita trazer a felicidade e o bem geral a todos, a vida em
grupo pode acarretar um grande obstáculo para uma união perfeita.
Principalmente se antes do escotismo o casal não estava ainda preparado para o
contrato social e espiritual que fizeram. Nestas horas a não ser os mais
próximos poucos ficam sabendo dos acontecimentos.
Em vários cursos que participei
sempre coloquei como dinâmica de grupo o que poderia trazer a desagregação
familiar na participação ao escotismo. Em primeiro lugar vinha o sacrifício de
quem não participava isto por achar que o outro estaria consumindo valores, sem
pensar que a família deveria estar em primeiro lugar e não o escotismo. As
rusgas começavam a aparecer e logo o bom relacionamento que deveria existir era
corrompido por um ou até dos dois cônjuges. Outro ponto que abordava em menor
intensidade era absorção do escotismo nos fins de semana e feriados. Sempre o
participante deixando a outra parte sem ele ou ela. Afinal dizem que basta três
horas por semana e estaremos colaborando o que não é verdade. O sábado dia utilizado
por boa parte das reuniões em Grupo Escoteiro, não bastam três horas. Muitas
vezes vai, além disto. Quase sempre o sábado passa a ser parte do escotismo.
Sobra o domingo isto se não haver atividades extra sede neste dia.
Já vi grupos com reuniões realizadas no
dia de semana. Isto ajudava muito com os fins de semana liberados para a
família. Mas existem muitos senões. Alguns não gostam, acham pouco tempo e não
é como sentir todos juntos em um só dia. Infelizmente não temos no escotismo
nada que possa ajudar ou orientar o Chefe ou a Chefe nesta hora tão difícil. Um
Psicólogo, um Conselheiro Matrimonial nem pensar. Sobra para os amigos tentando
ajudar, mas a maioria sem nenhuma experiência. Quando o Grupo Escoteiro tem
personalidade, onde todos se sentem como uma grande família então, a chamada
interação de pensamento será responsável para achar um caminho, isto claro se
as vibrações de amizade emitirem entre todos uma maneira de dizer – “Um por
todos, todos por um”. E olhe isto se aplica em todas as camadas escoteiras. Na
chefia e nos dirigentes.
Este preâmbulo que fiz do problema é
muito pouco comentado no escotismo e nunca lembrado pelos dirigentes. Deveria
ser obrigatório ter uma Unidade Didática falando sobre o tema em todos os
cursos escoteiros. O Escotismo não pode de maneira nenhuma substituir a família.
Ela está sempre em primeiro lugar. Felizes os que a família aos sábados partem
juntos para o escotismo. Sempre digo que nesta união se resume a família unida,
e isto acontecendo à alegria vai ajudar em muito não só a eles como a fazer um bom
escotismo. Bom para todos. O contrário acontecendo, perde-se muitas vezes a
noção do que é o certo e o errado, com ambos os cônjuges se considerando com a
razão. Esquecem os amantes do escotismo que o outro lado exige sua presença
principalmente em atividades sociais e familiares, que muitas vezes são
esquecidas.
Os novos voluntários muitas vezes
não são alertados. Acham ser um problema simples de resolver. O tempo nem
sempre lhes dá razão. Se eles não sabem dosar esta participação e quando reconhecem
o erro, pois um dia será pressionado pelo outro lado (aí entra a família dele e
dela) abandona as atividades escoteiras, Isto poderia ser resolvido se o Grupo
Escoteiro tivesse uma boa estrutura para entrosar família chefes, em atividades
paralelas dirigidas por alguém conhecedor. Tenho visto diversos aspectos do
tema. Sabe o pior deles? O participante ativo do escotismo além de ajudar
querendo resolver os problemas financeiros da sessão que atua ou mesmo do Grupo.
A família que não participa acha que está sendo sacrificada, que isto não trás
beneficio algum.
O Velho Escoteiro calou-se.
Pensei com meus botões a me analisar mais profundamente. Casado há oito anos,
sem filhos, eu e minha esposa não éramos um exemplo que dizem por aí de família
unida. Nunca tivemos desentendimentos, mas seria como dividíssemos o lar onde
dormíamos e íamos trabalhar. Quase nunca atividades sociais, ela era dona de si
e eu também. Não sei se isto é o matrimonio moderno e perfeito. O Velho
Escoteiro dormitava na poltrona de vime, já gasta com o tempo e eu em meu
banquinho de três pés pensava em tudo que falamos. Despedi do Velho Escoteiro e
na rua deserta, uma brisa gostosa daquele agosto ensolarado me pegou de pronto.
Pensava comigo que precisava mudar. Deveria dar o primeiro passo. Hoje só fazia
escotismo. Tornou-se para mim um modo de vida. Prometi a mim mesmo dar uma
guinada em minha vida.
Sem perceber olhei para o céu
estrelado. Sem lua, parecia que via a figura do Velho Escoteiro de carona em uma
estrela cadente passando rápido no céu e dizendo: - “Sua família é tudo, o
escotismo é um complemento, mas não o principal. Ela a sua família é sua razão
de viver”. Pisquei os olhos e o cometa sumiu em um ponto do universo. Nada mais
a dizer!
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