Uma linda historia escoteira

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Era uma vez...

domingo, 16 de março de 2014

Saudades do meu Balu


Conversa ao pé do fogo.
Saudades do meu Balu

          Não sei por quê. Já se passaram tantos anos e ele me veio à lembrança. Todos nos o chamávamos de Balu, ele tinha um sorriso enorme, uns olhos negros brilhantes, não era gordo, não tinha bigode e nem barba. Quando chegava ao grupo se aproximava da gente com o andar do Urso da Selva, e sorria... Que sorriso lindo – Lobos! Melhor Possível! Melhor Balu, melhor e melhor! E agente corria para ele, pulava em suas costas e ele caia pelo chão rolava com a lobada para lá e para cá. Em toda minha vida de lobo, eu amava minha Alcateia, ali eu sonhava como se estivesse dentro dela da Grande Selva de Mowgly. As histórias que Akelá contava a maneira da Baguera pulando e contando, e a Kaa se enroscando no chão, nas árvores me transportavam junto ao Lobo Gris e seus irmãos para dentro da floresta. Mas o Balu era diferente, ele ensinava a gente a subir em árvores, a descer pela corda a correr, a nadar e mergulhar no lago sem incomodar as rãs.

         Balu oh! Balu! Onde anda você hoje? Sei que estou Velho, alquebrado já não sou mais aquele menino de outrora, quando sentava na sua barriga e você boiava no lago das Meninas, quando me ensinou a tirar espinhos, quando me ensinou a comer os frutos bons. Balu! Que saudades! Nunca esqueci o canto do Louva Deus, o canto da Cotovia, a maneira dos pardais quando acordavam nas madrugadas e voavam em círculos em barulhos gostosos de ouvir. E como você imitava os macaquinhos pregos a chamar sua prole, e sabe Balu nunca esqueci quando você me contou que Mowgly foi raptado pelos Bandarlogues, os macacos sem lei e pouco asseados e o levaram pensando que ele conhecia o segredo do fogo. Era um segredo dos homens. E sabe Balu sei que você, a Baguera e a enorme serpente libertou Mowgly. Você Balu se disfarçou de macaco e dançou até encontrar o Rei Lu. Eu sei Balu que o Rei Lu tentou impedir que salvasse seu amigo Mowgly.

           Oh! Balu quantas coisas lindas você me ensinou e contou? E quando eu fiquei em recuperação em matemática? Foi você meu querido amigo quem me ajudou. Saia altas horas do seu emprego de vigia e ia a minha casa me ensinar. Sabe Balu você era um vigia Professor. Lembro-me de sua mãe dona Mercedes cozinheira da família Borges, que o amava mais que tudo. Chamavam você de tantos nomes só porque você era negro, mas Balu, igual a você nenhum branco podia se comparar. Eu tinha você no meu coração, não só eu como toda a Alcateia. Nunca esqueci quando você partiu. Disse-me que não seria para sempre, era somente um até logo, mais nunca mais vi você Balu. Nunca mais. Naquele acampamento que fizemos atrás da mata do Quati, eu senti uma saudade enorme de você Balu. Eu o Levi, o Nonato, o Pardal, o Zé Bulacha, e tantos outros ficamos chorando quando terminou o fogo do conselho. A Kaa Naldinha tentou nos alegrar nos fazendo dançar e a dança do fogo. Mas não adiantou.

            Sabe Balu, ninguém ficou sabendo por que você se foi. Uns disseram que sua mãe voltou para Nazária no Interior do Piauí. A mãe dela faleceu e deixou um sitiozinho para vocês. Olhe Balu não sei se você foi feliz lá na sua nova terra, mas enquanto você foi nosso Balu nunca em minha vida eu senti tanta felicidade. Eu fui feliz muito na minha vida escoteira, mas como lobinho eu fui muito mais. A gente fazia excursão, nadava no rio, atravessava pinguelas, brincava nas porteiras das fazendas, dormia sob as estrelas, entrava na selva que você dizia ser a Jângal, uma época que não sabíamos o que significava até que você disse que era uma grande floresta. Quantos acampamentos fizemos, em quantos galpões das fazendas dormimos nas noites de tempestades. Você lembra quando o Chiquinho passou a noite gemendo de dor de barriga? Comeu tantas goiabas verdes e só foi melhorar pela manhã. E você Balu, lá estava você ao lado dele, cantando, brincando até que ele dormiu pelas tantas da madrugada.

           Sabe Balu, só fui saber seu nome muitos anos depois. Gravei na minha memória para sempre. Juventino Honório Santos. Precisava escrever sobre você, precisava mesmo. Sei que você já deve ter partido para o mundo da felicidade. Eu tinha 10 anos quando você foi embora e me disseram que você tinha 25. Uma diferença de 15 anos. Hoje se estiver vivo vai estar com 88 anos. Será que ainda vive? Será que está sentando na beira do rio com seu cigarrinho de palha a pescar traíras e corvinas? Não sei. Não sei mesmo. Estou longe da sua terra, mas hoje não sei por que me lembrei de você. Saudades do meu Balu. Um Chefe que amei tanto que até hoje eu tiro para você o meu chapéu!

Anrê, Anrê, Anrê. 

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