Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

domingo, 22 de março de 2015

Se existem sonhos, a vida continua.



Hora dormir, amanhã é outro dia...
Se existem sonhos, a vida continua.

                   Foi em uma manhã como as outras. Levantei cedo como sempre faço. O sol já brilhava dando seu bom dia a todos. Hora de partir. Seria uma simples caminhada como fazia todos os dias. Sentia-me bem e enquanto caminhava dava tempo de pensar no passado e no futuro. O presente eu o estava vivendo e o achava radiante. Eu sorria feliz. Caminhava com prazer e alegria e em passos trôpegos, pois a idade e os prêmios que ela a idade me trouxe não me deixavam ir mais rápido. Era uma trilha. Uma linda trilha. Eu a descobri por acaso há alguns meses. Havia marcas a cada cem metros. A trilha não tinha mais de um quilômetro. Para mim o suficiente. Sabia que meu corpo de Velho trôpego não ia aguentar mais.

                 Tinha percorrido não mais que quatrocentos metros. Ainda faltava seiscentos para o final. Eu ia aguentar sem sombra de dúvida. Não dizem que devagar se vai ao longe? Os dois jovens se emparelharam ao meu lado. Dois frutos da mocidade. Ele com seus dezessete ou dezoito anos, alto, forte, camiseta para mostrar seu tórax e seus músculos fortes. Era um guapo rapaz. Ela nos seus quinze ou dezesseis anos. Magrinha e pequena, mas sadia. Sorridente ao lado do seu amado. – Ouvi seu vozeirão dirigido a mim - Velho levante o corpo, aprume os ombros, ande feito homem! – Olhei para ele. Sorri. Não ia dizer nada. Não tinha o que dizer. – Ele continuou – Conheço muitos velhos como você que andam feito homem! – Pensei comigo se eu era homem mesmo. Mesmo assim não disse nada e sorri.

                    A caminhada ainda estava longe do final. Seiscentos metros percorridos. Eles ao meu lado. Lembrei que quando cheguei passaram por mim correndo. Deram uma volta enquanto em andava em passos de tartaruga para percorrer cem metros. – Velho ele continuou – Esqueça suas dores, suas doenças, vamos Velho levante os ombros, dê uma passada mais larga. Velho ande feito gente grande! Quantos iguais a você percorrem caminhos mais longos? Quantos iguais a você ainda fazem questão de correr a São Silvestre? – Eu olhei de novo para ele. Minha respiração começou a acelerar. Era hora de diminuir o galope trôpego que estava dando. Sabia que meu ar tinha de ser dosado. Ele faltava de vez em quando. De novo olhei para ele e sorri. Não disse nada. Estava cansado. Muito. Para que responder a ele?

                      A jovenzinha o pegou pelo braço. Vamos meu querido. Ainda temos mais de vinte voltas a percorrer. Deixe o Velho em paz! Olhei para ela e senti uma alma boa. A gente nesta idade sabe onde mora a beleza no coração. – Ele rispidamente respondeu a ela que sabia a hora de correr. Que ela ficasse na sua! Ela abaixou a cabeça e não disse mais nada. Era submissa. Quem sabe o amor por ele a obrigava a aceitar tudo que ele dizia? Pensei comigo: - Será que seria uma boa esposa? Não sei. Prefiro não comentar o futuro dos dois. Ele olhou para mim sorrindo com ar de deboche – Velho, neste seu andar vais morrer logo. Parece como o meu pai. Sempre se entregando ao corpo. Eu nunca serei assim, sempre serei forte e a velhice nunca vai existir como existe em você. E o jovem partiu correndo. Sua cara metade correu atrás.

                 Eles viraram a direita na trilha que se escondia ao longe do pequeno bosque. Eu continuava calado, sorria, sabia o que eu era e o que sou e quem sabe o que serei. Desejei a ambos que a felicidade morasse para sempre com eles. Pedi a Deus que ambos vivessem juntos por toda a eternidade. Eu sabia que era um Velho. Um dia fui moço, corri mundo com meu chapéu de abas largas, com minha mochila escoteira, arvorei bandeiras aqui e ali por este país imenso. Eu me julgava imune à velhice. Mas ninguém escapa ao seu destino. Que ele e ela tivessem uma velhice tranquila. Senti uma brisa leve e intermitente no rosto. Eu gostava. As brisas das manhãs sempre me bem. Era um santo remédio. Lembrei-me das grandes caminhadas que fiz. Das grandes aventuras que se foram. Acho que era por isto que eu estava ali todos os dias mesmo com o pulmão reclamando porque lhe dei tanta nicotina no passado.

                  Demorei algum tempo, mas consegui chegar ao final. Tartaruga ambulante eu me apelidei. Sorri para mim mesmo ao pensar assim. Amanhã estarei de volta nesta gostosa trilha dos amores, dos amantes sonhadores dos velhos aventureiros que hoje não passam de uma pequena gota de orvalho do passado. Eu sabia que a vida continua. Não sei se os verei novamente. Não importa. Se isto acontecer irei sorrir para eles. Enquanto puder darei minhas voltas de um quilômetro. Não mais. Não adianta tentar andar mais que isto. Minha respiração não é boa. Queria um dia dizer a eles que tentava empinar os ombros, andar ereto e não conseguia. Minhas caminhadas sempre foram assim nos meus últimos tempos. Não sei se enganava a mim próprio. Eu sabia que meu corpo se esvaia aos poucos. Se não fossem estas pequenas caminhadas e a ajuda de Deus, eu sei que estaria entregue a um corpo inútil em uma cama qualquer de um pronto socorro da vida. Farei quantas caminhadas conseguir. Sorrirei para quantos jovens passar por mim. Devagar me lembrei do lindo versinho de Maria Cláudia – “Antes de correr, aprenda a andar. Tudo na vida tem sua hora, seu lugar. Tartarugas também chegam La!”. E meus amigos, se existem sonhos nos sabemos e também a certeza que a “vida continua”!


Boa noite durma gostosamente bem. Que a semana seja florida e que tudo para você seja mais do que espera. Que Deus esteja com todos vocês!

Nenhum comentário:

Postar um comentário