Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

sábado, 10 de janeiro de 2015

O dia em que Lagoa Vermelha parou para assistir o casamento do Chefe Bento Soares.


Lendas escoteiras.
O dia em que Lagoa Vermelha parou para assistir o casamento do Chefe Bento Soares.

                 Era uma cidade feliz. Muito mesmo. Todos lá se conheciam e eram grandes amigos. Aos sábados e domingos se reunião na praça central, cumprimentando-se, contando “causos” e lembrando-se dos velhos tempos. Chefe Bento era uma figura de destaque na cidade. Não porque fosse politico, mas pela sua bondade, pelo seu sorriso e pelo seu trabalho em prol da comunidade. Além de Chefe da Tropa Escoteira Andrômeda ele trabalhava no Posto de Saúde da cidade há mais de vinte anos. Dizia-se que quase todos os habitantes de Lagoa Vermelha foram escoteiros e isto quem sabe explica a grande amizade entre eles. Chefe Bento era mesmo diferente. Se fosse padre estaria explicado, mas não era. Sua tropa Escoteira o adorava. Nunca faltou a uma reunião. O Padre Albertinho não fazia nada sem o consultar. Fizeram tudo para ele se candidatar a prefeito e sempre recusou. O Prefeito Belarmino e as demais autoridades tinham por ele o maior respeito.

               Morava em uma casa simples bem próximo da sede Escoteira motivo pela qual ela estava sempre cheia de escoteiros. Sua mãe dona Lindalva tinha uma paciência enorme. Nunca brigava com a meninada. Ela comentava sempre que se Jesus dizia “vinde a mim as criancinhas” porque eu também não faço o mesmo? Chefe Bento estava noivo de Cidinha, uma jovem simples, que trabalhava como servente no Grupo Escolar Flores da Cunha. Magra, loira e uns olhos azuis que quase não se via, porque ficava sempre de cabeça baixa. Cidinha também era um amor de pessoa. Os alunos adoravam seu estilo e só não entrou para o Grupo Escoteiro porque achava que não tinha “estudo” suficiente. Fizera somente o quarto ano primário e parou de estudar para trabalhar. Sua família dependia dela. Chefe Bento e Cidinha namoravam desde crianças. Ambos achavam que não podiam viver um sem o outro. Nunca houve palavras bonitas entre eles de “eu te amo” “estou apaixonado” e só se beijaram uma vez, mas um beijo calmo, nada de língua prá lá e prá cá.

             A cidade em peso esperava o dia do casamento. Seria em 22 de novembro próximo. Menos de cinco meses. Seria uma festa de arromba. O Padre Albertinho fez questão de celebrar o casamento sem nenhum ônus para eles. A igreja vai ajudar também nos móveis do casal. Os lobinhos, escoteiros, seniores e pioneiros se cotizaram para as demais despesas. Uma lista foi passada de mão em mão de casa em casa. Estava quase cheia. Vários fazendeiros prometeram bois, porcos, galinhas e o clube de mães da igreja e do Grupo Escoteiro comprometeram-se a fazer tudo. Tudo caminhava a mil maravilhas. Em 12 de junho a tropa foi acampar na Serra da Felicidade. Sempre acampavam lá. Ficava nas terras do Coronel Adauto, um fazendeiro amigo e conhecido de todos. Na abertura do campo o Coronel Adauto estava presente. Ele gostava de ver a escoteirada formar e cantar o hino Nacional. Todos se espantaram desta vez. Ao lado dele uma bela morena de olhos negros, saia curtinha, cabelos negros longos, corpo escultural. Linda de morrer! – Minha sobrinha disse. Veio morar comigo.

            As patrulhas estavam cismadas. Chefe Bento presente como sempre foi, mas agora tinha ao seu lado a bela Francisca e eram somente sorrisos. Dia e noite juntos. Um dia Pedrinho os viu beijando junto ao moinho do Ventor. Um susto. A tropa toda ficou sabendo. Logo a cidade em peso sabia. Segredos? Ali em Lagoa Vermelha não havia. Todos sabiam de tudo. – Coitada da Cidinha diziam. Ela calada. Parecia que não estava revoltada. Claro, Chefe Bento continuou indo a sua casa como se nada tivesse acontecido. Um dia procurou o Padre Albertinho. - Senhor Padre, disse – Não vou confessar agora. É só um conselho. Não sei o que diz meu coração. Não quero ficar sem a Cidinha. Ela é meu sonho para vivermos juntos para sempre. No entanto não sei, mas estou amando a Francisca. O que faço padre?

                 Lagoa Vermelha em peso “cochichavam” entre si. O disse me disse das comadres eram enormes. Quem é essa Francisca? De onde veio? Tomar o Chefe Bento da Cidinha? Vai ver que é uma “pistoleira” da cidade grande. Onde o Coronel Adauto arrumou esta bruxa? Durante um mês o buchicho não parou. Chefe Bento não sabia o que fazer. Não tinha coragem de olhar nos olhos de ninguém. Sempre de cabeça baixa. O Coronel Adauto um dia pediu para ele ir até a fazenda. E agora pensou Chefe Bento? Ele vai me imprensar na parede. Não sei o que fazer. Nem mamãe soube me aconselhar.

               O dia acabava de amanhecer. Um céu avermelhado prenuncio de um dia quente e sem chuva. Um carro preto, grande atravessou a cidade de ponta a ponta e se dirigiu a fazenda do Coronel Adauto. O povo só ficou sabendo quando Zé das Flores, um vaqueiro da fazenda, entrou no Boteco do Martinho e contou as novidades. O marido da Francisca veio buscá-la. Era não queria ir. O Coronel Adauto ficou calado. Eram casados e ela devia obrigação a ele. Não concordou com a farsa dela se apaixonar pelo Chefe Bento. Pensou várias vezes contar o que sabia. Era casada com um mafioso da capital. Sujeito perigoso. Ela fugiu dele e mesmo aconselhando a voltar não aceitou.

                 O povo viu o carro preto pegando a estrada da capital com a Francisca dentro. Quando Chefe Bento soube, dizem seus amigos lá do posto de saúde que ele chorou. Dois meses depois o casamento foi realizado. Vieram escoteiros de varias cidades. Fizeram uma bonita passagem de bastões para ele e Cidinha passar quando saíram da igreja. Padre Albertinho sorria também. Quem sabe ele toma jeito? A nova casa estava preparada, mas eles pouco ficaram ali. Pegaram o ônibus de Lagoa Formosa naquela tarde e foram em lua de mel merecida.


                Acompanhei tudo. Sei que o Chefe Bento nunca mais foi o mesmo. Seu sorriso espontâneo desapareceu. Todos diziam que Cidinha estava sempre com os olhos vermelhos. Dois anos depois nasceu Tomé, um ano mais e Marcela veio ao mundo. Pararam por aí. Sei que depois dos dois rebentos os sorrisos voltou ao rosto do Chefe Bento. Sei também que eles viveram felizes para sempre.                       

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Mudando de conversa onde foi que ficou...


Conversa ao pé do fogo.
Mudando de conversa onde foi que ficou...

¶ Mudando de conversa onde foi que ficou
   Aquela velha amizade...¶.

            Não tem dia que vamos para uma reunião escoteira com a mente longe de tudo? A cabeça pesa. Afinal não somos humanos? Uma discussão no lar, um fato mal entendido, uma dificuldade que existia e brotou logo neste dia. E olhe, não adianta dizer que somos alegres e sorrimos nas dificuldades. Nesta hora não dá. Humanos! Deveríamos ser super-homens ou super-mulheres. Afinal não dizem maravilhas do Chefe Escoteiro? E sabe o pior? Alguém da família diz – “Você esqueceu-se da gente, só se preocupa com estes escoteiros”. Duro não? Mas a obrigação é maior que a razão. Você vai, chega lá, um Escoteiro ou um lobinho te cumprimenta, dá um sorriso. Puxa vida! E agora José?

¶ Aquele papo furado todo fim de noite
Num bar do Leblon ¶.

             Não sei se você já passou por isto. Saida para uma atividade. Ônibus estacionado. Horário estourando. Muitos atrasados. Tralha para colocar no ônibus, mil coisas a fazer. Uma mãe atrás de você – Chefe! Cuidado com meu filho! Chefe e as cobras? Chefe não esqueça os remédios dele! Chefe me ligue qualquer coisa! – O ônibus parte. Mães chorosas dizendo adeus. Parece o fim do mundo. Mas eles não vão aprender a ser alguém? Mal você se acomoda no ônibus e alguém começa a chorar. Tão cedo? O que foi? Fulano me bateu! Você chega ao local da atividade. Tirar a tralha, preparar tudo, corre daqui corre dali, a Patrulha tal não se entende. Lá vai você orientar. Hora do almoço. Alguns reclamando fome. Um Monitor correndo para dizer que um Escoteiro estava com a mochila cheia de biscoitos e comendo! Sua cabeça está a mil. O programa? Pluft! Foi para as “cucuias”. E agora José?

¶ Meu Deus do céu, que tempo bom!
   Tanto chopp gelado, confissões à bessa ¶.

                Dificuldades! Ah! Elas não são para nós escoteiros um bálsamo? Não dizem isto? Não está no oitavo artigo da lei? Não são elas quem nos faz sentir ser alguém? Ter coisas para contar, Lembrar... Chegar ao campo. Ufa! Esquecemos alguma coisa na sede? Alguém se lembrou? A meteorologia garantiu tempo bom. Céu pedrento? Chuva ou vento? Nuvens baixas cor de cobre? É temporal que se descobre? Um temporal. Uma ou mais barracas são levadas com o vento. Não armaram direito. A água invade o campo. Escolheram mal. Mas não dizem que se aprende a fazer fazendo? Agora não é hora de reclamar. E aí? Conseguiram cobrir o lenheiro? Putz! Lenha molhada. A chuva passou. Se tiver vento e depois água deixe andar que não faz mágoa. Mas olhe, cuidado, se tens água e depois vento, põe-te em guarda, e toma tento! E agora José?

¶ Meu Deus, quem diria que isso ia se acabar,
   E acabava em samba...¶.

              Segunda feira “braba”. Ir trabalhar. Corpo doido. Acampamento gostoso. Gostoso? Com chuva e vento? Vontade de ficar na cama. Ligar dizendo que não vou. Mas fazer o que? É melhor cantar. Não dizem que quem canta seus males espanta? Responsabilidade! Ah! Tenho que ter e dar exemplo. E a grana está curta. O dia não anda. Dizem que toda segunda feira é assim. Hoje vou tentar pensar pouco no escotismo. Você promete a si mesmo. Alguém pergunta – Como foi o acampamento? Você sorri azedo. Fala algumas palavras. O telefone toca – Chefe, meu filho está tossindo. Pegou chuva no acampamento? E ai você se pergunta – Quem precisa do escotismo, você ou ela? Mas você é e será sempre o responsável. Afinal não disseram que o Chefe é Doutor? Pluft! E agora José?  

¶ Que é a melhor maneira de se conversar,
   Mas tudo mudou, eu sinto tanta pena de não ser a mesma ¶.

                       Escotismo. Ah! Escotismo. Outro dia me chamaram de não sei o que. Não liguei. Não ligo mais. Um amigo me disse o seguinte: Olha, faça seu jogo, com poucos e com certeza, só terás alegria e não tristezas. Será? Poucos? Disseram-me que somos poucos. Tem hora que dou risadas. Ainda lembro quando me convidaram. Venha nos ajudar, é só duas ou três horas por semana. Gozado isto. Duas ou três horas? E as reuniões com chefes no grupo? E a Corte de Honra? E os conselhos de tropa e de primos? E a reunião do distrito? E a reunião com os pais? E as horas passadas em atividades ao ar livre? E os telefonemas na semana? E os e-mails? Puxa vida! Duas ou três horas? E quanto estou ganhando com isto? Nem bônus hora recebo. Se não tomar cuidado meu emprego vai para o “beleleu”. Risos. E agora José?

¶ Perdi a vontade de tomar meu chopp, de escrever meu samba,
   Me perdi de mim, não achei nada ¶.

                     Mas quer saber? Eu gosto do “danado” do escotismo. Adoro! Me sinto bem. Gosto do meu uniforme. Dos meus amigos. A turminha me enturma. Gosto de falar dele. De estar com alguém dele. De saber das novidades. Do Choro dos pais. Da alegria dos meninos. De um ônibus lotado e todos cantando o Rataplã. De ver na volta todos dormindo. Ar de cansado, dever cumprido. Aquele sono reparador. Ver todos partirem com seus pais ao retornar a sede. Passar a chave na porta e dizer: - Minha amiga até a próxima reunião! Isto não é bom? Dever cumprido mesmo? Ah! Escotismo! Tem igual? Existe outro? E agora José?

¶ O que vou fazer?     Mas eu queria tanto, precisava mesmo abraçar você. De dizer às coisas que se acumularam Que estão se perdendo sem explicação,     E sem mais razão e sem mais porque, Mudando de conversa onde foi que ficou.
    Aquela velha amizade¶...


 “Mudando de Conversa, é uma musica dos anos 60, de Mauricio Tapajós e Hermínio Belo de Carvalho. Magnificamente interpretada por Doris Monteiro”.