Afinal
somos um movimento de fraternidade?
Eu sou de outra época. Época
de tirar o chapéu e dizer: - Bom dia! Época de dar a vez aos mais humildes, de
dar as mãos aos mais fracos. Fui um Lobinho como todos foram, quem sabe um
“tiquitito” diferente. Uma matilha que se respeitava que conversava apesar da
tenra idade. Depois fui morar em uma patrulha. Passei a ser um lobo. Não mais
um Lobinho agora um patrulheiro. Comecei a ver o escotismo diferente quando
encontrei perdido em uma gaveta da sede um livro do Velho Lobo. “O Guia do
Escoteiro”. Encantei-me. Passei dois dias lendo e relendo. Tornou-se minha
bíblia escoteira. Nem sabia que existia UEB, Insígnia de Madeira e quando soube
que foi um velhinho chamado Baden-Powell quem nos deu esta vida de aventuras,
vibrei! – Passou a ser meu ídolo. Meus pais me davam liberdade. Eu corria pela
cidade, pelos campos, pelos rios e montanhas. Minha lei era a do Escoteiro e
toda semana a patrulha se reunia em casa de alguém para muitos assuntos. Um
deles era a lei. Valia a pena seguir? Não era fácil, ter palavra, ter honra e
ser fraterno não era para qualquer um. Comecei a pensar na fraternidade mais
profundamente.
O tempo passou. Meu passado
me lembrava de quantas mãos apertei. De quantos levei para alojar em minha
casa. De quantos conheci neste mundão de Deus. Eu tinha um defeito. Grave.
Desde menino meu rosto sempre fechado. Sorria por dentro, mas ninguém entendia.
Paciência. Passei a usar o abraço mais vezes, o aperto de mão e o meu querido
Sempre Alerta. Este tal de SAPS nunca me passou pela cabeça. Fui Chefe, fui
dirigente de curso. Até erraram em me entregar a tal quatro contas. Não sei se
merecia. A usei até o dia que cheguei à conclusão que devia devolver e devolvi.
Por quê? Uma luta de poder. Cada um querendo ser melhor que o outro. Não era o
escotismo que acreditava. Resolvi comprar uma foice e entrar nesta briga.
Tentei eleger uma diretoria, mas eu não estava incluído. Perdemos e fomos
educadamente perseguidos pelos vitoriosos. Não desisti do escotismo. Não me
querem lá? Então eu estou acolá. Voltei as minhas lides entre os jovens. Ali
sim era meu lugar. Sorrisos da juventude muda completamente nossa maneira de
viver.
Foram cinco Grupos
Escoteiros, foram cinco alegrias em conviver com jovens que até hoje moram em
meu coração. Houve sim uma época que me deram um cargo. Cargo? Isto mesmo.
Disseram que seria Comissário Regional. Gostava do nome, mas o achava pomposo
demais. Hoje não existe mais agora é Presidente! Importante isto não? Usei meu
cargo a exaustão para fazer fraternidade, para motivar, para ouvir e falar
menos. Tirei dos meus parcos soldos uma parte para viajar. Cidades em Minas
foram engolidas por mim. Outro dia alguém perguntou o que fiz e quanto éramos.
Bem não era minha preocupação. Precisava motivar chamar todos os escoteiros
mineiros para dar as mãos. A sede regional uma saleta pequena, taxas? Putz
sempre duro. Ainda bem que o governo nos deu carta livre nos correios. Olhe que
eu e meus amigos trabalhamos incansavelmente. Mais de trinta cidades de ônibus,
trem o escambal. Cursos, indabas, Ajuris, Encontros regionais. Hoje quando olho
as fotos só vejo sorrisos. Não me lembro de nenhum sem o espirito de B-P.
O tempo passou. Em
outro estado me entreguei aos cursos. Muitos. Quem sabe mais de cento e cinquenta.
Conheci cidades, viajei aqui e ali. Uma luta se travava entre os mais antigos.
Achavam que eu era um desconhecido. Um interventor. Eles sim eram que deviam
estar no meu lugar. Deixei o tempo me fazer de pião nas ideias badenianas.
Afinal tinha que me afastar. Não por eles, mas minha empresa me deu um chute.
Tinha de recomeçar. Veio à velhice, a falta de “Tchan”, pernas recusando a
andar. A mente firme e me toquei a escrever. Meu escotismo era outro e foi
então que passei a ver o tal escotismo moderno. Seria nossa redenção? Fiquei em
dúvida. Caneta na mão, teclado à frente e pensei... Porque não? Uma grande e
gigantesca parte de pessoas querendo aprender. Outra pequena parte arrogante,
tratando aos demais como reis, como ditadores, como os donos da verdade. Não
estava havendo respeito, cada um tentava desconstruir as ideias dos outros.
Eu sabia o que
significava fraternidade, mas e daí? Li que era um termo oriundo do latim
“frater”, que significa “irmão”. Dizia que ela designava a boa relação entre os
homens, desenvolvendo sentimentos de afeto próprios dos irmãos de sangue.
Pensei comigo e a Kaa não disse isto? Não viemos de Baden-Powell? Portanto
somos irmãos de sangue, tu e eu! – Se a fraternidade deveria ser o laço de
união entre os homens, fundado no respeito pela dignidade da pessoa humana
então o escotismo tinha de ser um baluarte para mostrar que suas ideias cobria
tudo isto. Não foi B-P quem um dia escreveu que devíamos espalhar nossas ideias
pelas nações e nos tornarmos amigos e irmãos? Era uma luta difícil. Esqueceram-se
dos mais humildes. Lembrei-me da nossa oração antes das refeições nos
acampamentos: Uns tem e não podem, outros podem, mas não tem. Nós que temos e
podemos agradecemos ao senhor. É uma luta difícil. Ainda temos muitos que não
se olharam para seus corações para saberem que estão magoando, estão
desconstruindo, estão prejudicando. Estão fazendo um outro escotismo. Quem sabe
é isto mesmo que querem fazer?
Eu sei que a maioria de
nós que participamos deste movimento fantástico sabe que o escotismo é também
um movimento que sempre promoveu a fraternidade. Afinal nosso método nos leva a
isto. Através da prática da boa ação, do trabalho em equipe, do respeito ao ser
humano, do amor aos animais e à natureza, os jovens participantes tornam-se
exemplo de liderança, responsabilidade, altruísmo e fraternidade. Ainda não entendo
estes prepotentes que se julgam dono da verdade. Não sei se eles reconhecem a beleza
do escotismo. Esquecem que suas palavras ferinas ditas ou escritas ofendem seu
irmão de ideal. Quantos se foram por se sentirem ofendidos, quantos se foram
por não serem reconhecidos, e quantos ainda irão ao ver que ali não é mais o
seu lugar. Disseram-me que como conceito filosófico a fraternidade está ligada
aos ideais promovidos pela Revolução Francesa. Ela se firmava na busca de
liberdade, igualdade e fraternidade.
Se não é isto que estamos
encontrando precisamos lutar. Nossas armas? O amor e compreensão. Nosso abraço
e nosso sorriso. Precisamos mostrar a todos que somos todos iguais e ninguém é
mais que o outro. Precisamos vencer esta empatia de alguns, de outros que se
firmaram na liderança e se acham donos das ideias. Precisamos mostrar que temos
que ser uma fraternidade democrática e que podemos sim salvar o mundo de si
mesmo desta luta desigual. Precisamos mostrar que assim como o sol nasceu para
todos, o escotismo também foi uma ideia de Baden-Powell para todos os jovens do
mundo. Quem pode fazer isto não são somente nossos lideres. Todos que um dia
prometeram na Bandeira também podem. Nossos lideres são nossos irmãos e eles
devem se compenetrar de suas responsabilidades, pois não estão dirigindo
batalhões de soldados para a guerra. São meninos, são homens e mulheres que
querem sim aprender a amar, a confraternizar e dizer aos quatro cantos do
mundo: - SOMOS TODOS IRMÃOS!
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